28 dezembro 2005

 

"Perceber que o mais importante é o social foi a descoberta mais importante de minha vida. Descobri que os economistas podem ser tecnicamente sofisticados e, mesmo assim, não captar a dimensão social dos problemas. Há pouco li o artigo de um conhecido economista brasileiro que deixou o emprego para vender assessoria. Ele mostrava que tudo o que estava acontecendo no Brasil era certo, que criar desemprego era muito importante, pois novos empregos seriam gerados mais adiante em outros setores. E o custo social até lá ? No meio do caminho morre muita gente. Mas esse seria o custo do progresso..."

Celso Furtado
"Mensagem aos Jovens Economistas"

 

O governo Lula negou a necessidade de transformação social
Francisco de Oliveira
26/12/2005

Este governo fez uma espécie de seqüestro da sociedade civil: desmobilizou os movimentos sociais, que foram colocados fora de ação; cooptou o movimento sindical; e, logo depois, indicou o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Luiz Marinho, para o ministério do Trabalho. Todas estas são marcas de um governo extremante conservador e anti-popular.

27 dezembro 2005

 

"O ornitorrinco é isso: não há possibilidade de permanecer como subdesenvolvido, e aproveitar as brechas que a Segunda Revolução Industrial propiciava; não há possibilidade de avançar, no sentido da acumulação digital-molecular: as bases internas da acumulação são insuficientes, estão aquém das necessidades para uma ruptura desse porte."

"Restam apenas as "acumulações primitivas", tal como as privatizações propiciaram: mas agora com o domínio do capital financeiro, elas são apenas transferências de patrimônio, não são , propriamente falando, "acumulação". O ornitorrinco está condenado a submeter tudo à voragem da financeirização, uma espécie de "buraco negro": agora será a previdência social, mas isso o privará exatamente de redistribuir a renda e criar um novo mercado que sentaria as bases para a acumulação digital-molecular."

"O ornitorrinco capitalista é uma acumulação truncada e uma sociedade desigualitária sem remissão."

Francisco de Oliveira

 

O Brasil, o futuro, a obsolescência
Reinaldo Azevedo
27/12/2005

Dizem que temos um problema grave de “gerenciamento”, de “gestão” — e a escolha de tais palavras não deixa de ser já um sintoma dessa aludida decadência. Não nego que exista o tal problema. Mas estou convicto de que o centro nervoso dos impasses do Brasil está na política — vale dizer: nas escolhas que antecedem os atos que disparam mudanças. Indagar para onde vamos, com quais instrumentos e por quê é a pergunta crucial.

O resto é espuma.

 

Rebelar-se
Mangabeira Unger
27/12/2005

Difícil é conseguir que nossa vida partidária permita candidatura que encarne o que a nação busca: aquilo pelo qual ela votou em vão em 2002. Transposta essa barreira, porém, é relativamente fácil produzir em outubro de 2006 uma surpresa libertadora: a maioria quer. Por isso, enganam-se os comentaristas quando apresentam a sucessão presidencial vindoura como predestinada a ficar encuralada em falsa escolha entre tucanos e petistas -os dois lados da camisa-de-força que a nação tenta romper.

26 dezembro 2005

 

Celso Furtado
"A Responsabilidade do Economista"

"O fato é que a civilização industrial e o modelo de vida por ela engendrado têm um custo considerável em recursos não-renováveis. Generalizar este modelo para toda a humanidade, o que é a promessa do chamado desenvolvimento econômico, seria apressar uma catástrofe planetária que parece inevitável se não se mudar o curso desta civilização."



 

Bullshit
João Sayad
26/12/2005

Se você pretende apoiar algum candidato, não o deixe fazer propostas claras. Deve fazer discursos contra a corrupção, a favor do crescimento da economia e contra a violência. A favor de um país mais justo e mais moderno. Convém ter algumas propostas de bom senso e inviáveis, como a criação de milhões de empregos ou o estabelecimento de uma carteira universal de saúde.


Vai ganhar o candidato que falar mais "bullshit", que enrolar mais ou que falar mais abobrinha. Não desanime. É apenas estratégia eleitoral. Quando ganhar, poderá fazer qualquer coisa ou o que for possível fazer. Isso, sim, deve deixá-lo preocupado.

23 dezembro 2005

 




"Hoje eu subi a mais alta montanha desta região. Meu único motivo era descobrir o que se podia ver daquele cume tão elevado."

Petrarca
26/04/1336

 

"a Globalização, que sinaliza uma era de prosperidade sem igual na história do Homem - um novo Renascimento, como tenho afirmado"

FHC
20/02/1996

"Nos últimos vinte anos, nos acostumamos a pedir que os economistas apontem as soluções para a crise que se prolonga. Trata-se de um erro. Seu modo de pensar é muito limitado."

César Benjamin
"Nó cego"

 

A porta do inferno
Mauro Santayana
23/12/2005

Dizem os jornais que as elites não admitem a eleição de José Serra, e já escolheram Geraldo Alkmin seu candidato. Sem tomar partido na disputa entre os dois, podemos entender agora as dificuldades de Serra na campanha presidencial passada. O mercado, ao admitir Lula, não pensava no metalúrgico, mas fazia o jogo de Fernando Henrique Cardoso. O ex-presidente, impedido de disputar o terceiro mandato consecutivo, não se empenhou na campanha do candidato oficial, o que não chega a ser novidade na política brasileira.

Fernando Henrique estava certo de que Serra seria - como continua sendo, segundo José Dirceu - muito independente. O ex-presidente da UNE tem origem de classe na parcela de trabalhadores imigrantes de São Paulo, e, assim, é visto a certa distância pelos quatrocentões e seus agregados.

Calculou mal também Fernando Henrique quando pensou que o governo Lula seria o caos. Em todos os aspectos, ele está sendo muito melhor do que o de seu antecessor - até mesmo no controle ético do governo, como se saberá um dia, se um dia os arquivos do Banco Central forem de domínio público, e as vítimas do Edifício Negro puderem ter acesso a seus documentos e registros secretos. Um dos que gostariam de conhecer tais papéis é José Eduardo de Andrade Vieira, que perdeu seu banco, o Bamerindus, na calada da noite, em negociação clandestina de Pedro Malan com o HSBC em Londres.

22 dezembro 2005

 

Sinais da América Latina
Luís Nassif
22/12/2005

A Venezuela deu o primeiro sinal. A Argentina seguiu atrás. Agora, a Bolívia, e, em breve, o Chile. Todos os sinais são de esgotamento do chamado modelo neoliberal, de redução total da regulação e minimização do papel do Estado.

Assim, a política neoliberal -para quem gosta de rótulos- se manifestou especificamente em uma política cambial de livre fluxo de capitais, remunerados por taxas altíssimas de juros e fora do alcance da Receita Federal por meio dessa imensa rede de fundos "offshore" pela qual caminha o capital brasileiro dolarizado.

Há um razoável nível de consenso sobre a importância do investimento produtivo externo e sobre o papel das filiais das multinacionais como agentes do interesse brasileiro com suas matrizes. Há noção clara de que a dívida pública precisa ser mais bem equacionada, não por meio de medidas agressivas mas de um manejo mais competente da política monetária, do uso racional de modernas ferramentas financeiras que permitam reduzir o peso do serviço da dívida e liberar recursos para o setor privado.

No entanto persiste esse vezo de parte influente da elite do receio do presidente forte. O perfil do futuro presidente terá de ser o de alguém com o destemor de Collor, a capacidade política de FHC, o senso de brasilidade de Itamar, a determinação de JK, a sensibilidade social de Lula, conhecimento técnico e equipe.


 

O caracol, sua concha e o Taboão
Ricardo Antunes

22/12/2005

Como os capitais globais não podem eliminar totalmente a força humana viva que trabalha, há, então, um movimento pendular que modula a classe trabalhadora hoje: por um lado, cada vez menos homens e mulheres trabalham muito, em ritmo e intensidade que se assemelham à fase pretérita do capitalismo da era da Revolução Industrial, configurando uma redução do trabalho estável que, entretanto, não elimina o traço de perenidade do trabalho, que se amplia, quer pela crescente precarização do trabalho, quer pela apropriação crescente da dimensão cognitiva do trabalho.

Contrariamente, entretanto, às teses que advogam o fim do trabalho, estamos desafiados a compreender o que venho denominando como ''a nova polissemia do trabalho'', a sua nova morfologia
[...]

Nova morfologia que compreende desde o operariado industrial e rural, passando pelos assalariados de serviços, pelos novos contingentes de terceirizados, subcontratados, temporários, pelas trabalhadoras de telemarketing e call center, pelos motoboys que morrem nas ruas e avenidas, pelos digitalizadores que laboram (e se lesionam) nos bancos, pelos assalariados do fast food, pelos trabalhadores dos hipermercados etc.

Sabemos que na gênese do capitalismo a classe trabalhadora fora dissociada de seus meios de produção, quebrando a indissolúvel unidade existente entre ''o caracol e sua concha''. O que nos obriga a indicar um desafio candente da sociedade contemporânea: urge recuperar, em bases inteiramente novas, a identidade inseparável entre o caracol e sua concha. Em pleno século 21.

21 dezembro 2005

 

"Ao entrar para o cançago, o antológico narrador de Grande Serão, Veredas também vendeu a alma ao diabo. Comportou-se sempre de acordo com o pacto. No fim da vida, porém, perplexo e solitário, descobriu que o diabo não a havia comprado."

César Benjamin
"Bom Combate"

 

Quem manda no governo?
Mauro Santayana
21/12/2005

Sem a grandeza épica das guerras sertanejas, a reunião ministerial de segunda-feira faz lembrar um dos pontos altos da literatura de Guimarães Rosa, quando Riobaldo toma de Zé Bebelo o comando do grupo de guerreiros. Ao identificar a indecisão do chefe, Riobaldo pergunta, com a ingenuidade do astuto: "Quem manda aqui?" A diferença é que, na ficção, há um desfecho, e da reunião ministerial não houve rumo nítido.

Furlan acolheu, em sua crítica, a inquietação dos industriais brasileiros, que se reúnem na Fiesp e na CNI. Como ministro da Fazenda, leigo no assunto e cumpridor das normas do Banco Central, Palocci falou em nome da até agora invencível Febraban.

O Brasil está diante dos dois como o bando de combatentes se encontrava nos inóspitos chapadões do noroeste de Minas. Na imaginação de Rosa, optaram pela ousadia de Riobaldo, levando Zé Bebelo a abandonar a disputa. É chegada a hora de o país escolher entre o Banco Central e a República. Não podem os bancos continuar ditando a vida política nacional, mediante controle monetário a seu serviço e em benefício dos que só vivem de juros, e não trabalham.

É chegada a hora de uma administração realmente política colocá-lo a serviço da República.


20 dezembro 2005

 


"Nos marcos da política macroeconômica atual, o Estado é como um viciado em drogas, enquanto o banqueiro é o traficante.

Alguém já viu viciado brigar com traficante?

O arranjo enriquece os banqueiros na justa medida em que o crédito para o setor produtivo cai. É hoje da ordem de 25% do PIB, um quarto aproximadamente do que prevalece no mundo.

A razão é simples: o Estado emite dívida pública que rende juros no lugar de moeda que não rende juros. Faz isso para manter os juros na lua e atrair capitais especulativos, não para combater inflação.

É um Estado viciado, drogado, improdutivo, que só serve aos traficantes de dinheiro."

J. Carlos de Assis

 

Juros e superávit
Luís Nassif
20/12/2005

No mercado, a taxa de juros de equilíbrio (a que equilibra ganhos em aplicações externas com as internas) corresponde ao que o que se paga por papéis brasileiros no exterior, menos a inflação mundial menos o custo de entrada e saída do dinheiro. Estima-se que, hoje em dia, esteja em 8,5%. Acrescentando 4,5% da inflação, chega-se a uma taxa Selic de 13,38%.


Supondo um superávit primário de 4,25%, um IPCA de 4,25% e um crescimento do PIB de 3%, ao final de dez anos a dívida cairia cinco pontos, como percentual do PIB. No caso de um crescimento de 4% ao ano, a relação dívida/PIB cairia 12,5 pontos -ficando em 39%.Vamos inverter as contas. De quanto precisaria ser o superávit primário para repetir essa performance, no caso de a taxa Selic ficar em 17% na média? Em ambos os casos, o superávit primário deveria saltar para 7,9% do PIB -uma diferença de mais de três pontos do PIB.

 




"Vocês acham que o 'establishment', o sistema, a Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo ), a Febraban (Federação Brasileira de Bancos ) e a elite vão deixar o Serra ser presidente? Já não deixaram da outra vez e não vão deixar agora."

"Serra é muito independente. Eles querem um pau-mandado, um presidente dócil às regras do capital internacional. Eles não querem o Serra presidente muito mais pelas suas virtudes do que pelos defeitos, que são muitos."

José Dirceu
O Globo - 20/12/2005

19 dezembro 2005

 

Um Tiro no Pescoço da Classe Média

"Avanços na história brasileira sempre foram liderados pela classe média. Ocorreram nos momentos em que ela deixou de ser massa de manobra de uma plutocracia de viés colonial e passou a propor, em nome da maioria, outra idéia do país. Todos esses episódios reorientadores caminharam na mesma direção: mudar as estruturas que, no Brasil, tornam as pessoas dependentes e, por serem dependentes, pequenas."

Mangabeira Unger


 

Empréstimo para dar segurança à especulação
J. Carlos de Assis
17/12/2005

E se em lugar de antecipar o pagamento de 15 bilhões de dólares ao FMI o Governo brasileiro resolvesse usar este dinheiro para pagar parte da dívida interna? A coisa funcionaria mais ou menos do seguinte modo: os dólares seriam vendidos no mercado livre, e os reais obtidos, um pouco mais de R$ 33 bilhões, seriam destinados a abater parte da dívida pública interna. Para o Governo, seria excelente negócio, pois usaria dinheiro barato para pagar uma dívida a um custo de cerca de seis vezes mais. Quando o débito externo vencesse, inverteria a operação, comprando os dólares para remetê-los ao FMI.

Haveria, sim, certa complicação cambial. Na hora de vender os dólares, a cotação no mercado livre tenderia a desabar. Na hora de comprar, a tendência seria de alta. Isso, contudo, poderia ser resolvido no mercado de derivativos, ou simplesmente operando com títulos cambiais no sentido de estabilizar as cotações: quando vendesse os dólares, o Banco Central compraria títulos cambiais de igual valor, irrigando o mercado monetário interno; quando comprasse dólares, faria a operação inversa, enxugando o mercado. Com essa engenharia financeira, seria possível economizar algo como uns R$ 5 bilhões no ano!

 

Por quê ?
Luiz Carlos Bresser-Pereira
19/12/2005

Confirma-se o óbvio: com um nível de taxa de juros real básica como o que temos, o desenvolvimento é tão inviável como o era com a alta inflação que enfrentamos entre 1980 e 1994. Naquela época, quando eu viajava para o exterior e dizia a meus interlocutores que nossa inflação girava em torno de 10% a 20% ao mês, eles ficavam abismados. Agora, quando digo que nossa taxa de juros real básica (do Banco Central) é de 14%, quando a taxa correspondente nos países ricos (e na grande maioria dos países em desenvolvimento) está entre 0% e 1%, ficam igualmente surpreendidos. Aquilo que para muitos brasileiros parece "natural" para eles é inconcebível.

Em um plano mais concreto, porque há três grupos poderosos interessados na manutenção da política de juros do Banco Central (que se confunde com a política de metas de inflação). Em primeiro lugar, temos os rentistas, aqueles que vivem de juros. Em segundo lugar, temos o setor financeiro. O que vemos é também um apoio muito forte do Tesouro americano, do FMI, do Banco Mundial e dos representantes das empresas multinacionais à política de juros do governo brasileiro.

Mas por que o governo Lula, que se beneficiou de toda a crítica consistente que desde 2002 (não antes) vem sendo feita ao nível da taxa de juros do Banco Central, não mudou essa política? Por que não a mudou, embora tenha prometido fazê-lo até o último dia da campanha eleitoral? Afinal, esses três grupos são poderosos, mas, em uma democracia, mais poderoso é o povo que o elegeu, ou, pelo menos, a sociedade civil que detém o poder político.

E por que aceitamos tais argumentos? Porque os próprios grupos interessados aqui e lá fora mantêm a hegemonia ideológica sobre o país, contando com o aval do "pensamento superior" dos países ricos.

 

Talento
João Sayad
19/12/2005


Há conservadores e progressistas, "esclarecidos" ou "atrasados". Conservadores esclarecidos temem e respeitam a fragilidade das instituições e das relações entre humanos. São depressivos. Progressistas esclarecidos são gente com fé no diálogo e indignação com o estado das coisas. São ansiosos. Ambos podem ser de direita ou de esquerda. Qual a diferença entre esquerda e direita?

Direita é quem lê o texto de uma única forma que vira mandamento ou lei. A esquerda relê, e a cada leitura escreve de novo. Direita são os fariseus, os donos dos textos.Respondi o questionário com caridade: pronúncia claríssima, inglês impecável. Há gente de esquerda que é de direita. E gente de direita que é de esquerda. Continuo desorientado. Melhor ler de novo.

18 dezembro 2005

 


César Benjamin
27/08/2005

"Em 1989 o Lula não ganhou a eleição porque não quis ganhar a eleição contra as elites. A campanha estava tão quente que os institutos faziam pesquisas diárias e nós tínhamos acesso. O Lula tinha ultrapassado o (Fernando) Collor com uma curva ascendente, e o Collor estava com uma curva descendente e já em segundo lugar. O debate estava marcado para sexta-feira à noite. A Rede Globo pediu para antecipar para quinta-feira. Quando o Lula entra no debate com o Collor e se entrega, ele estava dizendo: nestas condições eu não quero. O que eu percebi convivendo com ele naquele momento é que ele percebeu que tinha a eleição na mão, mas também que o nome dele estava vetado para a elite, que seria uma posse presidencial numa situação de crise. Ele não agüentou isso. Ele claramente não teve estatura para ganhar uma eleição contra a elite brasileira."


 


César Benjamin
27/08/2005

"Você tem as forças de natureza supranacional, representantes dos credores brasileiros, que ocupam o Banco Central e o Ministério da Fazenda. Esse é lugar cativo. A partir desta posição controlam a política monetária, cambial e fiscal e a execução do orçamento. O Ministério da Fazenda apequena e subordina os demais ministérios e com isso as forças supranacionais controlam o estado brasileiro. As demandas de natureza subnacional, algumas legítimas, dos estados, outras de lobbies, se expressam no Legislativo. Este Executivo que é controlado pelos credores estabelece negociações nas margens com as forças subnacionais. Para o povo pobre se faz algumas políticas sociais. No caso do Lula, basicamente o Bolsa-Família. Repare que neste arranjo ninguém cuida da nação."


"O Lula assume e encontra este sistema de poder já pronto. Não é ele que inaugura. Mas era o dever político e moral dele alterar este sistema. Foi eleito para isso. O que ele fez foi radicalizar este sistema de poder: o seu presidente do Banco Central é mais vinculado ao sistema financeiro internacional que os anteriores, as negociações no Congresso foram mais fisiológicas que as anteriores e a política social é a área que ele cuide mais para que ande, o Bolsa Família. Assumiu dentro do seu governo uma forma de organização do poder que é essencialmente conservadora. E isso reproduz uma coisa muito perversa na política brasileira que vem desde o Collor. A aliança dos mais ricos com os mais pobres. Os mais ricos são atendidos pelo Banco Central e o Ministério da Fazenda. E os mais pobres pelo Bolsa Família."

"A elite precisa reinventar esta aliança a cada quatro anos. A partir da Constituição de 1988, que dá direito a voto aos analfabetos, são os mais pobres que decidem a eleição. Esta é a tragédia do Brasil contemporâneo: a capacidade que os mais ricos tem de reciclar a aliança com os mais pobres a cada quatro anos."

 

Reinaldo Azevedo
23/11/2004

"Tenho para mim que uma boa batalha deve começar com o PSDB dizendo se acredita, por exemplo, que o spread no Brasil é alto por causa das linhas de crédito de aplicação obrigatória do BB, da CEF e do BNDES. Seria bom se os tucanos dissessem, agora e não depois, se estão mais para Henrique Meirelles ou para Celso Furtado — tanto quanto tal oposição faz sentido. Bati muito em Lessa. Acho que ele mereceu cada pancada. Mas, ao ler que, com sua saída, também saía a ideologia, quase que fui lá na calçada em que ele estava, “sobrevivendo a seu patético momento” (by Cecília Meireles), e me enrolei com ele na bandeira brasileira, sucumbindo, então, ao meu patético momento."

17 dezembro 2005

 

Gigante pela própria natureza
Demétrio Magnoli
09/12/2004

A série histórica de evolução do PIB evidencia o impacto da globalização sobre a economia e o território do país. Sob a perspectiva da economia mundial, o Brasil desempenha, cada vez mais, a função de uma fronteira de recursos naturais.

A trajetória do PIB conta a mesma história que o percurso do comércio exterior. A marcha do aumento do conteúdo tecnológico das exportações foi revertida. O Brasil, noves fora aeronaves e automóveis, consolida-se como fornecedor de commodities agrícolas, madeireiras e metalúrgicas. No fundo, o país exporta solo agrícola, luz solar, água, madeira e minérios. De modo geral, os complexos exportadores estruturam-se sob as asas de poderosos oligopólios. Em diversos casos, a exploração dos recursos naturais organiza-se na forma de enclaves territoriais conectados a eixos viários e a portos fluviais e marítimos.



 

Os críticos e os críticos da política econômica
Fernando J. Cardim de Carvalho
17/12/2005

Em um debate recente, um proeminente (e persistente) crítico da política econômica implementada no Brasil nestes últimos sete anos admitiu seu embaraço com a recém-descoberta verve crítica de um grande número de economistas que, até há pouco, apoiavam entusiasticamente esta mesma política econômica. Os “novos críticos” vêm ensaiando sua entrada em cena desde que as expectativas sobre o crescimento da economia em 2005 começaram a se deteriorar.


Em suma, alguns querem mudar o regime de política macroeconômica, outros querem ajustá-lo, ou torna-lo mais benigno. Os velhos críticos insistem que os problemas enfrentados pela economia brasileira têm raízes mais profundas e exigem um novo regime de política econômica, com coordenação mais efetiva de políticas monetária, fiscal e cambial, com intervenção ativa no mercado de câmbio, controles de capitais, novos processos de orçamentação, austeridade fiscal efetiva, etc. Já os que estréiam na crítica à política economia parecem acreditar que tudo que é necessário é um pouco mais de moderação na sua condução.


 

Lula e o livre comércio
(ou a unidade dos indiscerníveis)
César Benjamin
17/12/2005

À lei que define que os recursos públicos devem ser prioritariamente usados para pagar juros ao sistema financeiro, em detrimento de todos os demais gastos do Estado, rotula-se “lei de responsabilidade fiscal”. À prática de cortar gastos essenciais, para sustentar esses mesmos pagamentos, rotula-se “disciplina” ou “austeridade”, necessárias para formar um “superávit” metafísico (denominado, espertamente, “superávit primário”). Ao desmonte dos mecanismos de defesa de uma economia periférica e frágil rotula-se “abertura”. Aos efeitos do desvio de finalidade das contribuições sociais – recolhidas pelo Estado, conforme a Constituição, para financiar o sistema de Seguridade Social – rotula-se “déficit da Previdência”.

 

O Brasil é grande
Mauro Santayana
17/12/2005


O pecado vem de longe: São Paulo sempre fez questão de controlar a administração econômica. Tem sido um direito a que se arroga, pelo fato de ser o estado economicamente mais poderoso do Brasil. Na história republicana recente, quase sempre os ministros da Fazenda foram de São Paulo.

Essa hegemonia econômica - que passou a ser também política, sobretudo com a aliança entre os empresários paulistas e os militares - desequilibra a federação brasileira e aumenta as diferenças regionais, além de promover, mais ainda, a concentração da riqueza naquele Estado.

A concentração do poder em Brasília, em nome de São Paulo, desfigura o sentimento republicano de desenvolvimento do Brasil como um todo.

Quem for suficientemente audaz e criativo para propor à nação novo pacto republicano poderá mobilizá-la para outro e necessário salto.

16 dezembro 2005

 

Juro cai, mas país continua com a maior taxa do planeta
Fernando Rodrigues
15/12/2005

O Copom reduziu o juro básico (Selic) de 18,5% para 18% ao ano, mas o Brasil continua com a maior taxa real do planeta Terra. Há um quase consenso em Brasília no meio político-econômico sobre a mão pesada da equipe econômica na condução da política monetária. O terceiro trimestre teve uma queda de 1,2% no PIB, segundo o IBGE.

O crescimento econômico é vital para recuperação da popularidade de Lula. O petista só terá chances de reeleição com um crescimento robusto da economia em 2006.O juro alto no Brasil é um grande obstáculo para o crescimento.

Para que colocar o dinheiro numa construção ou outro investimento produtivo se deixar no banco rende mais?

Para saber o juro real é necessário descontar a inflação da taxa Selic. No caso do Brasil, para que o país perdesse a primeira colocação nesse ranking seria necessário que a Selic hoje fosse de 10,75% ao ano, o que daria um juro real de 6%.

 

Metade das mortes de crianças não é notificada
Primeira Leitura
16/12/2005

Mais da metade das mortes de crianças com até um ano de idade não são notificadas, segundo dados divulgados nesta sexta-feira pelo IBGE. As omissões de registro chegam a 51,3% no caso de menores de 1 ano de idade. O índice mais elevado de não-notificação é no Nordeste, a única região em que a taxa de mortalidade infantil com base nos registros civis não é consistente com os números estimados pelo próprio IBGE. O levantamento do instituto aponta para uma taxa de 34,9 óbitos por mil. Os dados dos cartórios resultam numa taxa de 13,1%. Nas demais – Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Norte, a diferença é bem menor. Mas não são apenas as mortes de crianças que são sub-registradas. O IBGE estima que 13,6% dos óbitos totais não são notificados. exto

 

550 mil nascimentos não foram notificados em 2004
Primeira Leitura
16/12/2005

Cerca de 550 mil crianças que nasceram em 2004 não haviam sido registradas até o primeiro trimestre deste ano, segundo as Estatísticas do Registro Civil, divulgadas nesta sexta-feira pelo IBGE. O número de nascimentos notificados foi de 2,8 milhões. O índice de sub-registro do ano passado ficou em 16,4%. Um avanço em relação a 2003, quando era de 19%. Desde 1994, a porcentagem de nascimentos não-notificados atingiu o pico em 1998, quando foi de 22,9%. Como nas demais estatísticas que têm relação com qualidade de vida e acesso a serviços públicos, há uma grande diferença entre os Estados mais ricos e mais pobres do país. Os piores números estão no Amazonas (41,4%), no Pará (37,6%) e no Maranhão (35%). Os mais baixos, no Distrito Federal (0,6%), em São Paulo (4,6%) e no Mato Grosso do Sul (4,7%). De acordo com instituto, a distância para se chegar a um cartório e dificuldades para que cartórios funcionem em pequenos municípios explicam os resultados.

 

Um país fora da curva
Ricardo Carneiro
16/12/2005

A explicação para essa performance não é trivial, mas certamente supõe a superação do paradigma liberal para o qual a garantia da estabilidade e as reformas microeconômicas, entendidas como a criação de uma ambiente mais apropriado para a operação do mercado, seriam suficientes para assegurar o crescimento sustentado. Nos últimos 20 anos, a América Latina e o Brasil foram palco de experimentos variados de política econômica de inspiração liberal centrados, de um lado, no primado da estabilidade e, de outro, na desregulação, fundada na eliminação de políticas verticais ou seletivas e acompanhadas de mudanças profundas na estrutura da propriedade via desnacionalização ou privatização. E é forçoso reconhecer, os resultados foram pífios.


Essas considerações sugerem que a tarefa de retomar o desenvolvimento sustentado é dupla. Ela supõe a implantação de um novo modelo através de políticas de desenvolvimento de corte seletivo, capazes de construir uma nova relação Estado-mercado e cujo efeito seria o estabelecimento de um horizonte de longo prazo para as decisões privadas, sobretudo as de investimento, reduzindo a excessiva influência das flutuações de curto prazo. Por sua vez, é necessário rejeitar o ultraconservadorismo da política macroeconômica posta em prática no atual governo, o que implica, sobretudo, encarar a estabilidade com maior flexibilidade. Em síntese, o caráter anticíclico da política macroeconômica não pode ser sacrificado por metas de inflação ou de dívida pública rígidas e irrealistas.

 

Redução do PIB e aumento da dívida pública: uma má combinação para 2006
Marco Aurélio Weissheimer
16/12/2005

A dívida do governo em títulos públicos já cresceu R$ 149,240 bilhões este ano. Entre outubro e novembro, ela aumentou R$ 22,16 bilhões, passando de R$ 937,34 bilhões para R$ 959,5 bilhões, um crescimento de 2,4%. Em relação a dezembro de 2004, o aumento da dívida interna chegou a R$ 149,24 bilhões, um crescimento de 18,42%. Os números foram divulgados nesta quinta-feira (15), no relatório conjunto do Tesouro Nacional e do Banco Central sobre a evolução das operações com títulos públicos, em novembro.

Segundo o coordenador-geral de Operações da Dívida Pública, Paulo Valle, o aumento foi resultado da emissão líquida de títulos (que superou os resgates de títulos em R$ 9,9 bilhões) e do pagamento de juros da dívida. Os juros elevados tiveram um forte impacto sobre o aumento da dívida interna, uma vez que mais da metade do estoque dessa dívida é remunerada pela taxa Selic, que, na quarta-feira, caiu para 18% ao ano.

 

A barbeiragem econômica
Luís Nassif
16/12/2005

A política macroeconômica é composta, grosso modo, pelas seguintes ferramentas: 1) Política fiscal. 2) Política monetária. 3) Política cambial.

É por meio da combinação dessas políticas que a área econômica tenta estabelecer situações de equilíbrio, que permitam à economia crescer sem grandes desajustes. É como um jogo de xadrez, em que cada mexida de peça muda o equilíbrio do tabuleiro. É papel do ministro da Fazenda, já que Receita e Banco Central fazem seu próprio jogo. É o técnico quem compatibiliza as estratégias.

Desequilíbrio 3: para impedir uma apreciação ainda maior do real, o Banco Central empreendeu política de compra de reservas. Essas reservas têm um forte custo fiscal, correspondente à diferença entre a taxa Selic e as taxas internacionais de juros. Nem assim segurou a apreciação do real.

Desequilíbrio 4: o aumento dos juros, somado à apreciação do real, provocou uma queda no PIB (Produto Interno Bruto) do ano, de esperados 3,5% para prováveis 2,5%, pulverização de R$ 17 bilhões da riqueza nacional.

O resultado final dessa mixórdia foi apenas o de aumentar a dívida pública e reduzir o crescimento. Nenhum dos objetivos iniciais foi alcançado. O que não impede essa elegia continuada e incompreensível à competência do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho.



 

Rasgando dinheiro
Luiz Carlos Mendonça de Barros
16/12/2005

O Banco Central esta rasgando dinheiro com sua política de juros altos e intervenção no mercado de câmbio. Alguns chamam a isso de "enxugar gelo". Estão errados, pois, se assim fosse, o único custo seria um aumento na conta do tintureiro de nossa autoridade monetária. O que esta acontecendo é mais grave, pois o custo dessa política será pago via conta de juros mais salgada nos próximos meses.

Como temos um sistema de juros controlados, quando o Banco Central compra dólares -e emite reais-, é obrigado a colocar títulos do governo no mercado. Com isso, ele cria um ativo em dólares, que lhe rende hoje cerca de 4,5% ao ano, e um passivo em reais, que custa algo como 16,5% ao ano. Para avaliar o custo efetivo dessa operação, é preciso ter uma idéia da taxa de câmbio no futuro. O próprio mercado nos responde a essa questão na medida em que as previsões mostram um quadro de estabilidade para dezembro do próximo ano.

Agora estamos vivendo um momento em que a economia cresce pouco -algo como 2,3% ao ano- e o saldo comercial volta a crescer em razão de importações menores. Momento claro para uma redução mais agressiva dos juros.

Mas não é isso o que está acontecendo. O tal conservadorismo obtuso do BC, assustado com o mito de que no Brasil juros baixos levam à volta da inflação, está agravando os problemas causados pelo excedente de dólares. E não será a intervenção maciça que vai resolver isso.

14 dezembro 2005

 

Lucros e Crescimento
Luiz Carlos Bresser-Pereira
13/12/2005

Os jornais publicam duas informações econômicas no mesmo dia: o PIB crescerá 2,5% neste ano, e o lucro dos bancos, de janeiro a setembro, aumentou 39% quando comparado com o mesmo período do ano anterior. O fato que relaciona esse descompasso perverso é a escandalosa taxa de juros do Banco Central.

 

A performance asiática e as exportações brasileiras
Ana Claudia Alem, Fabrício Catermol e Patrícia Zendron
14/12/2005

O Brasil exporta para mais de 30 países na Ásia e as vendas para a região, em 2004, responderam por 15% das exportações brasileiras. Os principais produtos exportados do Brasil para os países asiáticos são os classificados como básicos. Nesta categoria, a Ásia é o segundo destino das vendas brasileiras, com 26% de participação em 2004, atrás somente da União Européia.

O predomínio de produtos de baixo valor agregado manifesta-se claramente quando analisado o conteúdo tecnológico das exportações brasileiras para a Ásia. Do total das exportações brasileiras para esses países, 90% são produtos de baixa intensidade tecnológica ou commodities primárias.

 

A infâmia em defesa da política monetária
J. Carlos de Assis
14/12/2005

No país surrealista em que vivemos, a idéia de que é a taxa mais baixa de juros do BNDES que pressiona o Banco Central a elevar as suas, conforme o raciocínio de "Veja", paira naquela zona cinzenta entre a imbecilidade econômica e a má fé. A rigor, não é muito diferente da fábula do lobo e do cordeiro, no sentido de que a taxa baixa do BNDES pressiona tanto a taxa mais alta do over como o cordeiro, bebendo água num ponto abaixo da correnteza, suja a água do lobo um trecho acima. É isso, contudo, que se apresenta aos leitores da revista como um axioma econômico.

Quando se soma a isso o superávit primário, estamos diante da maior máquina de transferência de renda jamais inventada na histórica do capitalismo. Tira-se dos pobres sob a forma de impostos para dar aos ricos sob a forma de juros. Em três anos, foram 420 bilhões de reais. Só este ano, serão mais de 150 bilhões. Tudo isso sem gerar um único emprego. Não obstante, "Veja" acha que é pouco. Quer que o sistema produtivo pague mais juros. Dá total cobertura a Palocci e Meirelles. Para suavizar o custo da sua dívida externa, quer simplesmente continuar enterrando as perspectivas de retomada do Brasil.

13 dezembro 2005

 

Octávio Ianni
"Histórias do Brasil Moderno"

"No emaranhado de desafios que compõe e descompõe o Brasil como nação, as produções científicas, filosóficas e artísticas podem revelar muito mais o imaginário do que a história, muito menos a nação real do que a ilusória. Mas não há dúvida de que a história seria irreconhecível sem o imaginário. Alguns segredos da sociedade se revelam melhor precisamente na forma pela qual ela aparece na fantasia. Às vezes, a fantasia pode ser um momento superior da realidade."

 

As razões para a dose elevada do superávit
J. Carlos de Assis
13/12/2005

A teoria que está por trás dessa aberração nos diz que é preciso equilibrar, internamente, com saldo fiscal primário em real, o saldo externo em conta corrente em dólar. Entretanto, trata-se de um conceito estático. Dinamicamente, na medida em que a economia cresce, aumenta a necessidade de meios de pagamento para mantê-la em funcionamento. Isso significa que pelo menos parte do saldo externo em conta corrente pode ser financiado internamente por emissão monetária e de crédito não inflacionária, concorrendo para a expansão da economia e do emprego.

É isso que explica a fantástica expansão econômica do Japão e da Alemanha no pós-guerra, a partir de imensos superávits comerciais. Se estivessem sujeitos às mesmas regras fiscal-monetárias que ordenam atualmente a economia brasileira, esses países teriam que fazer elevados superávits primários para neutralizar o efeito monetário expansivo de seus grandes saldos comerciais. Em conseqüência, teriam travado suas economias. Pode-se dizer o mesmo das economias emergentes atuais da Ásia, com seus gigantescos superávits externos, porém acompanhados de uma política fiscal-monetária expansiva.


Contudo, existe também o argumento de que se deve fazer um alto superávit primário para garantir a credibilidade da dívida pública perante o investidor interno. Não nos explicam de quanto deve ser o superávit, mas pode ser tão alto quanto o necessário para pagar todos os juros da dívida pública às taxas atuais, conforme quer o deputado Delfim Netto. Trata-se de outra sandice. É, igualmente, uma visão simplista e estática das relações fiscais-monetárias, pois desconhece o efeito do crescimento econômico na absorção do crescimento da moeda e do crédito, e na redução da relação dívida/PIB.

12 dezembro 2005

 

E o desenvolvimento industrial do Brasil?
Kevin P. Gallagher
12/12/2005

Ainda assim, o setor agrícola brasileiro tem chance de sair-se vencedor.

No entanto, o Brasil parece estar disposto a sacrificar quase qualquer coisa por esses ganhos, incluindo a sua própria capacidade de estimular o desenvolvimento industrial.

Mas o caso do Brasil é diferente. Sozinho, o setor agrícola brasileiro receberá 23% dos ganhos no mundo em desenvolvimento, ou seja, US$ 3,6 bilhões. Por si só, esse dado não quer dizer que os ganhos serão distribuídos em meio à população; mas, se fossem, eles resultariam em quatro centavos por pessoa.

Esses foram os ganhos. Mas, e os custos? Muitos economistas que tratam das questões de desenvolvimento têm mostrado uma crescente preocupação com a possibilidade de que países como o Brasil terminem sacrificando o terreno de suas políticas industriais, as mesmas que fizeram deles atores tão pujantes na economia mundial.

 

Exportar etanol?
Joaquim Francisco de Carvalho
12/12/2005

A produtividade média dos canaviais brasileiros está em torno de 70 toneladas de cana por hectare por ano e de cada tonelada extraem-se 80 litros de etanol, de modo que temos 5.600 litros de etanol, por hectare, por ano.

Para não depauperar o solo, os canaviais devem ter uma área bem maior do que a de efetivo plantio e, ao lado disso, há os aceiros, estradas internas, lagoas de decantação de vinhoto, etc.

A China enfrenta, já sabemos, graves problemas de poluição atmosférica, provocados pela queima de combustíveis fósseis. Seria pois razoável que, para mitigar esses problemas, resolvessem eles misturar 20% de etanol brasileiro à sua gasolina, criando, para a nossa indústria alcooleira, uma demanda de 27 milhões de metros cúbicos de etanol, por ano.

E demandaria uma área equivalente à metade de São Paulo, não deixando espaço para reservas biológicas, nem para florestas nativas, nem para a agropecuária, nem para a expansão urbana. Sem falar da biodiversidade, que seria irremediavelmente comprometida.


 

Outro Modelo Econômico
Léo Lince
12/12/2005

Com o peso da crise nas costas, o povo acompanha as dissonâncias no coral dos poderosos com um misto de incredulidade e espanto. Já votou contra este modelo na última eleição presidencial, mas o governo que daí resultou não lhe ouviu os clamores. Apesar da perplexidade e do desalento, o povo sabe que o bate-boca no interior das elites pode abrir outros espaços. O ano que vem tem eleição presidencial. A cidadania, nas largas alamedas, vai postular de novo a consigna que ganhou a eleição anterior e que, depois, foi posta de lado: "outro modelo econômico".

 

Harold Pinter
João Sayad
12/12/2005

O exemplo real foi apresentado por Albert Hirschman ao defender a idéia de que o desenvolvimento econômico, para ser desenvolvimento, é necessariamente desequilibrado. Há 20 anos, o Brasil e toda a América Latina procuram o desenvolvimento equilibrado -equilíbrio macroeconômico, economias abertas, apoio à pequena e média empresa, sistema jurídico confortável para o investidor estrangeiro. Crescemos 2,5% ao ano.

O crescimento na China é obra de um equilibrista que mantém três pratos girando na ponta de bengalas, uma em cada mão e a terceira no queixo -um país sem sistema jurídico amigável para investimentos, exporta mais do que importa, tem reservas cambiais absurdamente altas, sistema bancário insolvente e cresce mais do que 9% ao ano.

09 dezembro 2005

 




Celso Furtado
"A Busca de Novo Horizonte Utópico"

"Em nenhum momento de nossa história foi tão grande a distância entre o que somos e o que esperávamos ser.
"




 

"Delenda Bevilaqua"
Paulo Nogueira Batista Jr.
09/12/2005

Uma curiosidade: trata-se de um gordo. Dizia Nelson Rodrigues que as banhas predispõem aos afetos, à conciliação, aos aconchegos. Nesse caso, não. O gordo em questão se notabiliza, ao contrário, pela inflexibilidade e pelo dogmatismo.

Ora, o Banco Central é provavelmente o último lugar em que se deve colocar um dogmático. A autoridade monetária trabalha em um ambiente marcado por incertezas e riscos. Não consegue interpretar e prever o funcionamento da economia com precisão. Os efeitos das decisões de política monetária, cambial e financeira são sempre difíceis de antecipar.

Nessas condições, caro leitor, fundamentalistas costumam produzir desastres. De posse das alavancas decisórias na área monetária, um grupo de tecnocratas, ou mesmo um economista individual, pode fazer um estrago monumental. A combinação mais perigosa é essa mesma: inexperiência e dogmatismo. Aliás, o segundo resulta, às vezes, da primeira.

Encontrei-me, nesta semana, com o célebre economista argentino Roberto Frenkel. Ele conhece bem o Brasil, mas perguntou-me, espantado: ''Explica uma coisa: como é que o governo brasileiro conseguiu a proeza de derrubar o PIB com a economia mundial em fase de forte expansão, com todos os ventos internacionais a favor?''.

 

Solvência e crescimento
Luis Carlos Mendonça de Barros
09/12/2005

"O quadro que se abre para o próximo presidente, com uma situação externa de excelente qualidade e uma inflação da ordem de 4,5% ao ano, é muito parecido com o que tivemos em 1966, durante o regime militar.Depois de um período marcado por uma política econômica extremamente ortodoxa e que provocou um grande ajuste macroeconômico, seguiu-se um período de desenvolvimento acelerado. Será que a história vai colocar Lula e Palocci lado a lado com o general Castello Branco e Roberto Campos?"

 

A dívida pública e as suas múltiplas faces (II)
J. Carlos de Assis
08/12/2005

"Seria a dívida pública, externa ou interna, um empecilho para a retomada do crescimento? De jeito nenhum. O que impede nosso crescimento são as taxas de juros básicas extremas e o superávit primário indecente. Para baixar as taxas básicas de juros, que remuneram a dívida pública interna, basta adotar o controle de capitais. Como conseqüência, a necessidade de superávit primário se reduziria drasticamente, e teríamos uma folga de uns 50 bilhões de reais anuais para financiar não inflacionariamente um programa de desenvolvimento que leve ao pleno emprego. Feito isso, as duas dívidas, a interna e a externa, tenderão a ficar irrelevantes a longo prazo.

08 dezembro 2005

 



Caio Prado Jr.
"História Econômica do Brasil"

"Se vamos à essência de nossa formação, veremos que na realidade nos constituímos para fornecer açúcar, tabaco, alguns outros gêneros; mais tarde, ouro e diamantes; depois algodão, e em seguida café, para o comércio europeu. Nada mais do que isto. É com tal objetivo, objetivo exterior, voltado para fora do país e sem atenção a considerações que não fossem o interesse daquele comércio, que se organizarão a sociedade e a economia brasileiras."

"Este início, cujo caráter manter-se-á dominante através dos séculos da formação econômica brasileira, gravar-se-á profunda e totalmente nas feições e na vida do país. Particularmente na sua estrutura econômica."



 

BC: Cavalo de Tróia?
Paulo Nogueira Batista Jr.

Nas circunstâncias dos anos recentes, a explicação para o nível dos juros reside, no meu entender, essencialmente em uma mistura de interesses e ideologia, ou seja, em uma combinação de influência política de setores poderosos e de doutrinas econômicas inflexíveis. Desde 2003, acrescentou-se a essa mistura um terceiro elemento: a fragilidade e insegurança do governo Lula.

Quem são os beneficiários dos juros altos? Bancos e outras instituições financeiras, investidores estrangeiros e fundos de pensão, por exemplo. Muitas, provavelmente a maioria, das grandes empresas não-financeiras conseguiram se adaptar aos juros permanentemente elevados: quando não possuem braços financeiros próprios, têm sobras de caixa aplicadas e não dependem de crédito bancário doméstico.

Mas note, leitor, o seguinte: o comando do BC está nas mãos de um grupo que tem pouca ou nenhuma identificação com o governo. São pessoas que, pela sua formação e origem, se identificam mais com o governo passado. E elas controlam variáveis de grande impacto sobre o ambiente econômico em que transcorrerão as eleições de 2006.

07 dezembro 2005

 


Sérgio Buarque de Holanda
"Visão do Paraíso"

"Teremos também os nossos eldorados. Os das minas, certamente, mas ainda o do açúcar, o do tabaco, de tantos outros gêneros agrícolas, que se tiram da terra fértil, enquanto fértil, como o ouro se extrai, até esgotar-se, do cascalho, sem retribuição de benefícios. A procissão dos milagres há de continuar assim através de todo o período colonial, e não a interromperá a Independência, sequer, ou a República."

 

Dois tempos da democracia recente
Márcio Pochmann

O Brasil não possuiu uma cultura democrática consolidada. Dos seus mais de 500 anos de história, não há registro, ainda, de meio século, pelo menos, de experiência política ancorada na plenitude democrática.As duas décadas de democracia completadas em 2005 constituem o mais longo período desde a Revolução de 30. O que existia, até então, não passava de regimes políticos censitários, com votos de apenas e tão-somente homens ricos, deixando de fora 98% da população, que se compunha de mulheres (ricas ou não) e de homens pobres.


Com o Plano Real, a privatização do setor público, o aumento da carga tributária e o contingenciamento do gasto social se transformaram em normas a serem perseguidas pelos governos de plantão, escravos -em maior ou menor medida- do novo modelo econômico que se funda na regressão social. Por conta disso, a Constituição Federal tem sido crescentemente identificada com um obstáculo ao avanço da materialidade do próprio modelo econômico e social neoliberal.

As sucessivas e variadas reformas implementadas a partir do governo Collor não têm tido outros motivos que não sejam o rebaixamento do padrão de proteção social até os níveis exigidos pelo contínuo avanço do modelo econômico dominante no Brasil. Resta saber, todavia, até quando o segundo tempo da democracia recente poderá ser suportado pelo conjunto da população, uma vez que aumenta o descontentamente social, cada vez mais favorável à implantação de qualquer regime político que se apresente como suficiente para melhorar a condição de vida do homem comum.

 

Controlar a inflação praticando as taxas de juros mais altas do mundo não é mérito para ninguém
André de Melo Modenesi
07/12/2005

Não há dúvida de que elevações na taxa Selic contribuem para a estabilidade de preços. No entanto, a inflação brasileira tem se mostrado pouco sensível à taxa de juros: uma pequena redução da inflação requer uma elevação significativa da taxa Selic. Não se pode considerar bem-sucedida uma política monetária que, para manter a inflação em torno de 5,5%, requer uma taxa de juros real de 14% ao ano. Dito de outra forma, controlar a inflação praticando as taxas de juros mais altas do mundo não é mérito para ninguém.

Há um motivo fundamental para explicar a baixa sensibilidade da inflação à taxa de juros: a alta participação dos preços administrados (ou controlados pelo governo) no IPCA, cerca de 30%. O elevado peso dos preços administrados na composição do IPCA faz com que os preços livres tenham de ser mantidos excessivamente reprimidos - pela manutenção da Selic em níveis muito elevados - para que a média da variação dos dois grupos de preços (ou o IPCA) permaneça em níveis compatíveis com as metas de inflação.

Outros motivos também explicam a baixa sensibilidade da inflação à taxa de juros. A existência de pressões inflacionárias pelo lado dos custos tem sido negligenciada. E as elevações da Selic - ainda que reduzam o potencial de repasse dos custos para preços - não atacam as causas de pressões inflacionárias com origem nos custos.

Outra razão é o fato de um dos principais canais de transmissão da política monetária, o do crédito, ser pouco relevante na economia brasileira. O que se deve à reduzida importância do crédito no país: a relação crédito/PIB é de apenas 30%, ao passo que em economias desenvolvidas passa de 100%.

Enquanto essas questões não forem resolvidas, as amarras da política econômica não poderão ser removidas sem que a inflação recrudesça e, portanto, a promessa do "espetáculo do crescimento" não deixará de ser mera retórica política. Enfim, no Brasil, a política econômica não pode se reduzir ao tripé metas de inflação-câmbio flutuante-equilíbrio fiscal.


06 dezembro 2005

 


Wladimir Pomar
"Um Mundo a Ganhar"

"A burguesia brasileira não é a mesma de alguns anos atrás. A burguesia transnacional prometera inserí-la no deslumbrante mundo desenvolvido mas, com a voracidade própria dos carnívoros predadores, deglutiu a maior parte da burguesia industrial, mastigou grandes nacos da burguesia comercial e da burguesia financeira e manteve entre seus dentes a burguesia agrária."


"É natural que, assim como entre seus ancestrais estavam os traficantes de escravos, entre seus pares atuais estejam setores burgueses emergentes do crime organizado e do narcotráfico."

 

"faltou coragem ao governo Lula"
Luiz Gonzaga Belluzzo
03/12/2005


A política cambial foi, na realidade, movida pela taxa de juros - cuja valorização fez com que o Brasil perdesse ganhos que tinha obtido a duras penas. Hoje em dia, todo mundo diz que a exportação continuou crescendo; continuou sim, porque a situação mundial era muito favorável. Isso fez o Brasil crescer. Mas de fato, do ponto de vista do desenvolvimento industrial e produtivo, o Brasil está hoje mais atrasado em temos relativos do que estava há 20 anos atrás.


Esperava-se uma estrutura produtiva similar à de um país emergente como a China, mas o Brasil ficou muito atrasado. Alguns setores se atrofiaram, como o de eletroeletrônicos. O próprio setor de bens de capital se atrasou tecnologicamente. Trata-se de um processo de desindustrialização, que só vai ser percebido quando terminar o "efeito financeirização" que nós estamos vivendo e que continua valorizando o câmbio, que continua fazendo com que a bolsa de valores brasileira suba - chegando a 30 mil pontos – e que transforma o Real em uma moeda semi-conversível. Essas condições permitem que o Brasil continue ampliando suas exportações, mas a composição destas reflete a nossa estrutura produtiva. O Brasil está quase se transformado novamente em exportador de produtos agrícolas.

 

"A política industrial não pode ser subordinada às questões macroeconômicas",
Fernando Sarti
03/12/2005

Podemos dividi-las em dois grandes grupos: de um lado, um grupo liberal, que vê uma função muito restrita e subordinada da política industrial em relação às demais políticas. Para esses, basicamente, a política industrial serviria como uma forma de resolver falhas de mercado ou falhas de governança, sendo subsidiária e tendo como intuito promover melhorias de externalidades. É uma visão muito restrita e passiva.

A outra visão, que eu denominaria "desenvolvimentista", atribui uma importância muito maior para a política industrial. Primeiro, propõe-se que ela não deve estar subordinada à política macroeconômica, ao contrário: dada a sua sinergia, ela deve ser ativa e integrada a essa política macroeconômica, numa posição hierárquica superior à que possui dentro da visão liberal. Segundo, propõe-se que ela não deve ser apenas uma política horizontal e não-discricionária; ao contrário, ela precisa ser discricionária e deve tratar desiguais de forma desigual. Transcendendo sua dimensão horizontal, tal política precisa olhar de forma diferente para os diversos setores, elegendo quais serão privilegiados e beneficiados, dependendo da estratégia de desenvolvimento.

 

Ave, Palocci, os que vão matar te saúdam!
J. Carlos Assis
06/12/2005

É absurdo quando dizem, referindo-se à violência no Rio e em outras metrópoles brasileiras, que estamos numa guerra civil. Não há guerra civil onde não há uma busca organizada de afirmação de cidadania pelos dois lados. O que temos é, de um lado, os que valorizam tanto sua vida, ou a boa vida que levam, que simplesmente ignoram ou passam por cima das necessidades mais elementares dos demais; do outro lado estão os que, mergulhados pelo sistema de comunicação "democrático" no mundo glamoroso da sociedade de consumo, sabem que só terão acesso a ele pela prática da violência.

O Governo Lula reduziu a política social a programas assistencialistas, remetendo ao mercado a solução para o desemprego, que é a verdadeira raiz da crise social. A política econômica que vimos seguindo há mais de dez anos é uma fábrica recorrente de desempregados. Quando se somam a estes os subempregados (os ocupados que ganham menos de um salário mínimo), chegamos a quase um terço da população ativa. É a maior tragédia social de nossa história. No entanto, falando no Congresso, o ministro Palocci sacou as últimas estatísticas da Pnad para sustentar que não há relação entre a política econômica e a crise social.


 

Proposta semitosca
Luís Nassif
06/12/2005

O documento "Propostas de Política Fiscal para os Próximos Dez Anos", preparado pelo Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão e classificado como "tosco" pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, não é tosco. Para chegar a essa qualificação, precisa melhorar um pouco. Melhor seria denominá-la de semitosca.É um PowerPoint com 21 slides. Quatro são de títulos; oito são de gráficos ou tabelas com diagnósticos; cinco são de propostas, quatro são de números jogados ao léu, sem nenhum detalhamento maior sobre suas implicações.

Não há uma simulação das relações entre política monetária e fiscal. Um ponto da taxa Selic corresponde a quase todo o investimento.Aliás, é inacreditável que um documento que se propõe a discutir o equilíbrio orçamentário não tenha uma simulação sequer para avaliar níveis de superávit versus custo da dívida pública. Ou que o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, disponha-se a discutir relação dívida/PIB sem manter o menor controle e a menor articulação entre política monetária e fiscal. Cada ponto da taxa Selic tem um impacto de 0,5% do PIB na dívida líquida. No início do ano, havia uma previsão de superávit primário, de acordo com as previsões de taxa Selic. Todo a meta de superávit primário foi modificada a tranco, para atender à alta da Selic. E essa relação nem sequer consta do trabalho.

 

Mistificação Econômica
Roberto Mangabeira Unger
06/12/2005

O conceito corriqueiro de investimento público associa, ilegitimamente, duas idéias distintas: a de despesa, não recorrente, por um ativo duradouro, sobretudo um ativo físico -uma coisa-, e a de despesa para obter fonte de benefícios ou de renda futuros. Um instante de reflexão basta para mostrar que a relação entre essas idéias é apenas acidental. O ativo duradouro pode não produzir benefícios futuros: por exemplo, pirâmide construída para enaltecer o governante. E o benefício futuro pode resultar de despesa corrente: por exemplo, em salários de agentes de saúde pública. A associação forçada das duas idéias fundamenta a preferência por gasto em coisas sobre gasto em gente.

Exemplos esclarecem. Construção de escola seria investimento. Pagamento de professor seria custeio. Uma das maiores deformações do gasto em educação no Brasil tem sido preocupar-se mais com construção de escola do que com pagamento e formação de professor.

País radicalmente desigual como o nosso, precisa gastar em gente mais do que em estradas e usinas. Entre nós, a distinção entre investimento e custeio serve para atacar o gasto na educação e na saúde dos brasileiros bem como nos salários e nas pensões dos funcionários do Estado. É como aquela bomba que mata as pessoas e deixa as coisas incólumes.

 

A hora de Lula
Jânio de Freitas
06/12/2005

Os fatores negativos fecham o círculo. Lula não demonstra ter resposta para nenhum deles, muito menos para o todo. Mantém-se nos seus discursos de autolouvações e promessas que os fatos, nos três anos de governo, tornaram ineficazes. Há sinais de que está inquieto, irritado, inseguro das suas e das perspectivas do governo. Mas nada disso indica a percepção de estar em um daqueles momentos cruciais, que decidem o destino de um presidente ou de um governo. A depender só das decisões que ele, e só ele, tome em um sentido ou em outro. Ou deixe de tomar.Perceba ou não, é nesta hora crucial que Lula está.

05 dezembro 2005

 

Celso Furtado
"Análise do 'Modelo' Brasileiro"

"Nunca se insistirá suficientemente sobre o fato de que a implantação portuguesa na América teve como base a empresa agrícola-comercial. O Brasil é o único país das Américas criado, desde o início, pelo capitalismo comercial sob a forma de empresa agrícola."


"Quando se observa com uma ampla perspectiva a organização da agricultura brasileira, percebe-se claramente nela um elemento invariante, que é o sistema de privilégios concedidos à empresa agro-mercantil, instrumento de ocupação econômica da América Portuguesa."

 

"O Brasil tem medo de crescer"
Paulo Skaf
05/12/2005

Na visão dos técnicos do Banco Central, o princípio é o seguinte: cada vez que se tem demanda, abafa-se, com juro alto, e acaba-se com ela com medo do risco de inflação. Alguns esperam que o Brasil tenha investimentos sem demanda. O que eles ainda não descobriram é que primeiro vem a demanda, depois o investimento. Ninguém investe antes para depois vender. O que provoca o investimento é a carteira de pedidos, os negócios, a demanda. Quando se esfria a demanda, freia-se o investimento e não se tem crescimento, ou se tem um crescimento ínfimo. No Brasil há um medo de crescer. Cada vez que se chega a um crescimento de 3%, o BC faz questão de acabar com ele. Crescer é a solução para um país como o nosso.

 

Calma
João Sayad
05/12/2005


Na semana passada, sentimos a vida como uma pasta de dente que há sessenta anos vem sendo espremida. Depois de tanto trabalho, discussão e torcida, fomos expelidos para fora do tubo, brancos e assustados, para descobrir que:

1) O número de pobres diminuiu (se um pobre ganhar um real a mais acima de R$ 120 mensais, deixa de ser pobre);
2) a renda dos ricos diminuiu (é rico quem ganha em média R$ 9.000 por mês);
3) em decorrência de 1 e 2, a distribuição de renda melhorou. Antes tivesse piorado;
4) a renda per capita parou de cair depois de dez anos de queda ininterrupta. Um anticlímax;
5) o produto nacional caiu 1,2 % no último trimestre com relação ao trimestre anterior.

O Banco Central não acredita nos dados e pede calma. Calma, pois a esperança de vida dos brasileiros aumentou, e quem chegou aos 60 anos tem a esperança de mais vinte anos de vida pela frente. Podem ser vinte anos de vida numa Terra mais quente e com a Amazônia seca. É possível ainda que vejamos um presidente eleito com apoio dos traficantes. Com certeza, viveremos num país pobre, perigoso, sujo, com estradas esburacadas e inflação muito baixa. A natureza é sábia e nos protegerá: estaremos surdos e não conseguiremos mais ler os jornais.


 

O PSDB e a política monetária
Luiz Carlos Bresser-Pereira
05/12/2005

A doença macroeconômica no Brasil, entre 1980 e 1994, foi a inflação; a partir de então, é a alta taxa de juros. É ela que debilita as finanças do Estado, transfere cerca de 8% do PIB dos pobres para os ricos, obstaculiza os investimentos, pressiona a taxa de câmbio (o preço do dólar) para baixo, promovendo mais cedo ou mais tarde crise de balanço de pagamentos, e mantém a economia semi-estagnada.

Afinal, essa política visa apenas gerar juros para rentistas e câmbio valorizado para empresas multinacionais enviarem lucros para o exterior.

Entretanto, uma estratégia competentemente definida de redução da taxa de juros apresenta riscos modestos, muito menores do que os envolvidos em mantê-la. Essa estratégia certamente exigirá o aprofundamento do ajuste fiscal, mas esse ajuste não será, como se alega, para baixar a taxa de juros em um futuro longínquo nem, como na verdade é, para manter a relação dívida/PIB constante e os credores sossegados, mas para efetivamente reduzir a taxa básica do Banco Central. E não se falará em, "primeiro", fazer o ajuste para depois baixar os juros: as duas medidas, às quais necessariamente se somarão mudanças institucionais relacionadas com a política monetária e de indexação de preços públicos, deverão ser implementadas ao mesmo tempo.


 

PIB
Luiz Gonzaga Belluzzo
05/12/2005

O crédito consignado deu impulso à demanda de bens duráveis nos trimestres anteriores, mas foi curto em razão dos juros muito altos. Outro elemento dinâmico, que são exportações líquidas, também não tiveram o mesmo ímpeto.

O elemento que talvez tenha contribuído muito para a queda, o elemento dinâmico para a economia, é a indústria e suas ramificações. No desempenho da indústria, o investimento é o elemento que compensaria esses dois outros fatores de expansão, que são exportações líquidas e o consumo, mas ele tem se comportado de maneira bem modesta.

Mas o fator fundamental é realmente a combinação juros e superávit primário, que não foram exatamente expansionistas e tiraram fôlego do crescimento.

No Brasil, tem essa coisa do câmbio flutuante, que é uma história mal contada. Se você olha pesquisas do FMI, a maior parte dos países está em regimes de câmbio intermediários, porque não dá para ter câmbio flutuante em um mundo onde há movimentos de capital e arbitragem financeira. O Brasil fez uma coisa de uma imprudência e um risco enorme, que não precisava correr [permitir a valorização do real].

04 dezembro 2005

 

Celso Furtado
"A Economia Brasileira"

"O estudo do processo inflacionário focaliza sempre dois problemas: a elevação do nível de preços e a redistribuição de renda. Seria, entretanto, errôneo supor que se trata aí de dois problemas autônomos. A palavra inflação induz a esse erro, pondo em primeiro plano o aspecto monetário do processo, isto é, a expansão da renda monetária. Contudo, essa expansão é apenas o meio pelo qual o sistema procura redistribuir a renda."

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