30 maio 2006

 


  • “Como toda ave eles tem de andar pelo mundo. Tucano voa e às vezes voa fora de hora. Tucano tem essa natureza."
  • “ACM age como um senhor de engenho."

    Cláudio Lembo
    30/05/2006

  • “Que culpa tem a elite? O que que é isso? A elite é a mais prejudicada, é a mais intimidada, a mais cobrada! A elite não tem culpa, absolutamente."


  • Hebe Camargo
    30/05/2006

 

Pas du tout
João Sayad
29/05/2006

As autoridades brasileiras afirmam que a economia brasileira tem sólidos fundamentos. O presidente Bernancke, do Fed americano, não é claro. Chineses nunca falam em fundamentos. Quem fala da produção, do emprego e da renda não menciona os fundamentos. Em geral, economistas de banco ou das economias reformadas da América Latina sempre sofrendo com especulação no dólar ou nas bolsas falam em fundamentos. Pois analisam a economia a partir das aparências. Insistem, na minha modesta opinião, sobre fundamentos, pois falam exatamente sobre as coisas que fundamento não têm.

29 maio 2006

 

Da falência das instituições às várias formas do crime organizado
Waldemar Rossi
29/05/2006

A guerra civil está instalada no Brasil. Não se trata de uma “guerra política”, que implique em luta por mudanças radicais no país, com vistas a eliminar as profundas injustiças que crescem sem limites. Seria altamente positivo se a rebelião civil implicasse, em vez do crime organizado, a mobilização popular em favor de um novo Brasil, onde o direito e a justiça social prevalecessem sobre a prática extorsiva, sugadora e destrutiva do neoliberalismo. Trata-se, como podemos claramente identificar, de uma guerra entre facções do crime organizado, instaladas dentro e fora das instituições.


Soberania alimentar requer rompimento com o agronegócio
Ariovaldo Umbelino
29/05/2006

Veja, o grande equívoco dos agricultores brasileiros foi desenvolver aqui a tese de que a agricultura capitalista é capaz de competir no plano mundial, com possibilidade de vencer essa competição capitalista. Isso aconteceu exatamente porque se conseguiu, nesses esquemas de securitização das dívidas, camuflar os subsídios, ou melhor, a sua ausência. No mundo inteiro, a agricultura é subsidiada. George W. Bush, no início de seus dois mandatos, tratou de votar o Farm Bill, que destinava, em quatro anos, algo em torno de US$ 250 bilhões de dólares para a agricultura norte-americana. O Brasil é o único país do mundo onde agricultores e alguns economistas dizem que é possível uma agricultura capitalista que não se insira nesses moldes.

Se olharmos hoje o mercado da soja e sua produtividade – ou seja, a quantidade de soja produzida por hectare -, ela é praticamente a mesma no Brasil, nos Estados Unidos e na Argentina. Nos Estados Unidos, produz-se majoritariamente o milho, não a soja – que é um quinto da produção do milho. Lá, a produtividade do milho está entre 9 e 10 toneladas por hectare. No Brasil, ela está entre 2 e 3 toneladas por hectare. Na realidade, a agricultura brasileira não tem condições de competir no mercado mundial.

Os agricultores brasileiros conseguiram, no entanto, convencer a mídia e uma série de intelectuais de que são competentes do ponto de vista capitalista e que podem disputar esse mercado, criando o mito de que a agricultura e o agronegócio são os responsáveis por boa parte das divisas internacionais do Brasil e que têm uma participação significativa no PIB. Isso é uma grande mentira, porque, se nós tomarmos a participação dos produtos agrícolas no mercado mundial, vamos verificar que a agricultura responde por menos de 10% das exportações mundiais. No caso brasileiro, inseriram no que eles chamam de PIB do agronegócio a parte da indústria e também os supermercados, inflando os dados e o próprio mito. E é esse mito que garante a importância do agronegócio, o combate à reforma agrária e que proporciona uma reivindicação maior de recursos do “fundo público”, como diz Chico de Oliveira.Se olharmos o volume da produção de arroz, feijão e mandioca, que são os três principais alimentos da população pobre desse país, não há nenhum crescimento desde 1992. O preço da âncora verde é, assim, o não-aumento da produção. E se a produção não aumenta, mas a população cresce, temos que recorrer à importação. Hoje, o Brasil é o maior importador de trigo do mundo. Importamos também arroz, feijão, o que é um absurdo total, uma vez que são culturas que o país podia produzir. Se não produz, é por falta de uma política voltada para a proteção à agricultura de pequeno porte. O resultado é que não temos hoje, em pleno século XXI, nem segurança alimentar e nem muito menos soberania.

27 maio 2006

 


"É preciso remover o conceito arcaico de direito adquirido e cassar privilégios para os quais as pessoas não contribuíram".

Tarso Genro
(repetindo a mesma frase utilizada por Bresser em 1995, o petista disse "a valer" a tese do direito adquirido, senhores de escravos continuariam a ter "direito de posse" dos negros mesmo após a abolição.)
27/05/2006

"Tem que distinguir direito adquirido de privilégio adquirido. Os escravagistas afirmavam no século passado que a escravidão não poderia acabar, porque eles tinham direito adquirido sobre os escravos."

Bresser Pereira
(ministro da Administração de FHC, diante da dificuldade de aprovar a reforma da Previdência em 1995)


26 maio 2006

 

Interesses antogônicos
Fausto Wolff
26/05/2006

Trinta anos atrás, Mario Henrique Simonsen, ministro da fazenda, teria explicado assim o então novo mínimo de Cr$ 76,80: uma família tem em média quatro pessoas, portanto: quatro cafezinhos e quatro pãezinhos x 4 = Cr% 2,56 por da, por família. Cr$ 2,56 x 30 = Cr$ 76,80. Por mais cruel que fosse, a conta batia.

Hoje, o salário é de Cr$ 350. O cafezinho e o pãozinho custam R$ 0,90 por pessoa. Um ser humano pode viver tomando quatro cafezinhos e quatro pãezinhos por dia ( sem manteiga, pois com manteiga o país quebra segundo a elite, os banqueiros, os latifundiários, os políticos e o ministro Mantega). R$ 0,95 x 4 = R$ 3,80. Uma família composta de quatro pessoas gasta por dia em café e pão R$ 15,20. R$ 15,20 x 30 = R$ 456.

A conta não bate, mas vimos como progredimos ?

 

O PSDB e a centro-esquerda
Luís Nassif
26/05/2006

O problema do PSDB não são as eleições de 2006. É o que será do partido depois delas. Aparentemente, os tucanos caíram na armadilha que ajudaram a montar, de ataques ao governo Lula. Tomou-se a nuvem por Juno. Houve uma leitura equivocada, de confundir o antilulismo de parte da opinião pública com um neoconservadorismo radical, grosseiro, sem credibilidade que grassou em parte da opinião pública midiática. Ora, o eleitorado tucano nunca foi conservador, sempre manteve um diálogo amistoso com entidades de direitos humanos, condenava acerbamente o modelo de segurança pública de Paulo Maluf, adotava um discurso não-dogmático em relação à economia, defendia a profissionalização do setor público, a inclusão social sem paternalismo. Principalmente exercitava um discurso não-radical, respeitoso, em torno de idéias. Ou seja, ocupava inconteste o campo centro-esquerda progressivo e não-dogmático, modernizante e fora dos parâmetros de agressividade da política tradicional.

O PSDB está gradativamente abandonando sua base histórica e disputando o eleitorado do PFL -se situam aí, segundo a analista, os conflitos entre ambos os partidos.

E o PSDB que tem as idéias e a liderança de José Serra, os estudos de Nakano e Bresser, o Instituto Sérgio Motta, os irmãos Mendonça de Barros, a visão de inovação de um Pacheco, de saúde de um Barjas, fala po meio de um Tasso e sua truculência explícita ou de um FHC e sua tropa de choque refinada. Está na hora de reavivar idéias, de trazer propostas inovadoras, antes que o partido se transforme em um PFL requentado.

25 maio 2006

 

O indizível
Demétrio Magnoli
25/05/2006

Os custos incalculáveis da "guerra às drogas" são pagos pelos cidadãos dos países produtores e consumidores, sob as formas de expansão concomitante da criminalidade e dos sistemas policial e carcerário, mas, sobretudo, do apodrecimento das instituições de Estado e da degeneração geral do tecido social. A droga clandestina serve, eventualmente, às operações especiais. Na administração Reagan, a distribuição de crack entre jovens pobres das cidades americanas financiou, diretamente, a guerrilha anti-sandinista dos "contras". As rendas do tráfico corrompem as polícias e a política, no Afeganistão, na Colômbia, na África do Sul ou no Brasil. "Elite da Tropa", o livro indispensável de Luiz Eduardo Soares, André Batista e Rodrigo Pimentel, conta a história da dissolução das fronteiras entre o Estado e o crime no Rio de Janeiro. Lembo e Lula, em dobradinha sofística improvável, rimaram crime e pobreza. O destampatório do preconceito desvia os olhares da matança, primeiro de policiais, depois dos eternos suspeitos. O dinheiro da droga, devidamente lavado, irrigará campanhas eleitorais. Candidatos proporão erguer presídios em profusão. Ninguém, nem o ministro Gil, levanta a voz para propor o indizível.

 

Maioria dos presos de SP e do RJ é jovem, pobre e com pouco estudo
Valor Econômico
Cristiane Agostine
24/05/2006

Jovem, pobre, solteiro, com pouca escolaridade e religiosidade. Esse é o perfil predominante da população carcerária de São Paulo e do Rio de Janeiro, segundo pesquisa feita pela Fundação Getulio Vargas. Realizado depois da onda de violência nos presídios paulistas, o levantamento mostra que, além dos investimentos em educação, a geração de emprego e a diminuição da desigualdade social devem ser prioridades.

 

Aguardando o próximo soluço
Luís Nassif
25/05/2006

Quando se entra em processo continuado de apreciação do real, a reação do investidor é a seguinte:

1) Suponha um investidor que traga US$ 10 milhões com o câmbio a R$ 2,40. Em reais, serão R$ 24 milhões.
2) Nos EUA, ele receberia uma remuneração de 5,5% ao ano. Ao final de 12 meses, seu saldo seria de US$ 10,55 milhões. No Brasil, a remuneração da Selic seria de 15,5%. Ao final de 12 meses, teria um saldo de R$ 27,6 milhões.
3) O lucro dependerá do movimento do câmbio. Se o câmbio continuar em R$ 2,40, o ganho do investimento no Brasil será 9% superior ao americano.
4) Se o real se apreciar 10%, o ganho do investidor americano seria de 21,1% sobre a aplicação nos EUA.

É essa expectativa que produz um aumento do fluxo de dólares para o país assim que se delineia um quadro de apreciação da moeda, sem que o governo intervenha.


Estouro da boiada?
Paulo Nogueira Batista Júnior
25/05/2006

Se tivesse se preparado melhor, o Brasil poderia tirar de letra esse surto de instabilidade externa. Não precisaríamos ter praticado juros tão extravagantes, tão mais altos do que os do resto do mundo. Poderíamos ter reservas mais altas do que os atuais US$ 64 bilhões. A China (exclusive Hong Kong) tem US$ 875 bilhões. A Índia, US$ 154 bilhões. A Rússia, US$ 226 bilhões. A Coréia do Sul, US$ 223 bilhões. O México, US$ 76 bilhões. Poderíamos ter introduzido um sistema de controles preventivos dos fluxos de capitais.

Em vez disso, o governo Lula deu seqüência às medidas de liberalização do período Collor-FHC. A conta de capitais permanece, portanto, potencialmente volátil. O BC tenderá a responder a uma eventual saída de capitais com "parcimônia" na diminuição dos juros e, se a coisa ficar preta, poderá até aumentá-los outra vez. O mínimo que se poderia fazer, neste momento, seria arquivar as novas medidas de liberalização cambial em discussão no governo. O pior de tudo foi a sobrevalorização do real nos últimos anos, uma retomada inacreditável das práticas daquele Napoleão de hospício que dirigia a política cambial no primeiro mandato de FHC. O real forte vem atingindo de maneira cada vez mais nítida a agricultura, a indústria, os setores exportadores e aqueles que competem com importações.

Bem dizia Nelson Rodrigues: "Já fizeram o elogio da loucura e ninguém se lembrou ainda de fazer o elogio, muito mais procedente, da burrice. Ninguém observou o óbvio: a burrice influi muito mais no comportamento humano do que o fator sexual, ou econômico ou outro qualquer".

24 maio 2006

 

Che Lembo, a piada
Clóvis Rossi
24/05/2006

1 - Cláudio Lembo foi, durante anos, o braço direito de Olavo Setúbal, o patriarca do banco Itaú. Setúbal, como todo mundo sabe, é um dos sobrenomes mais clássicos e lustrosos da "elite branca" e da "burguesia", um autêntico "quatrocentão". Não consta que, durante todo o período em que trabalharam juntos, Lembo tenha pedido que o "burguês" Setúbal abrisse a bolsa ou lhe tenha cobrado as culpas pela miséria da pátria tropical.

2 - Lembo foi da Arena e, depois, do PDS, os dois partidos que deram sustentação à ditadura militar. Não consta que a ditadura fosse anti-burguesia nem que Lembo tenha feito críticas, por exemplo, às violações dos direitos humanos por ela praticadas, quando os "comunistas" abriam à força a bolsa da "burguesia".

3 - Lembo passou para o PFL, partido que está há 12 anos subordinado fielmente ao PSDB, apoiando todas as políticas que a "burguesia" não cessou de aplaudir, até porque cevada com o pagamento de juros obscenos. Como, de resto, o faz hoje o neo-amigo de Lembo, Luiz Inácio Lula da Silva. Não consta que Lembo tenha reclamado dessas benesses à burguesia nem que tenha descoberto antes a "deslealdade" de seus companheiros de viagem. Doze anos de distração é demais, não?

Lembo tem, sim, entre outras, a grande qualidade de não se levar a sério e de ser capaz de rir de si mesmo, o que raramente acontece com os políticos, que se acham mais do que são. Não é culpa dele o surto recente de frases de efeito. É culpa dos que as levamos a sério.

 

O câmbio exótico e os juros artificiais
J. Carlos de Assis
24/05/2005

O Governo brasileiro está brincando de liberalismo. Nós estamos repetindo os erros da política monetária e cambial do primeiro governo FHC, atraindo conseqüências que podem ser similares. O que ainda está sustentando o processo macroeconômico, até o momento, é a fantástica performance exportadora. Contudo, ela é o resultado, em grande parte, no setor de manufaturas, do estreitamento do mercado interno; e, no setor das commodities agrícolas, da quebra virtual dos produtores. Isso tem limites. E logo veremos que não há nada mais exótico do que a liquidação de produtores e de empregos por um câmbio artificialmente alto.

 

As nuvens e o dilúvio
Mauro Santayana
24/05/2006

Os chefes políticos da oposição e do governo sempre acharam que das nuvens escuras não viriam mais do que tempestades ocasionais e rápidas, como são as chuvas de verão. E, ao que parece, continuam nessa consoladora ilusão, quando se arama o dilúvio. Muitos acreditam que bastam as medidas policiais costumeiras, como as de cortar as comunicações entre os presídios e as ruas, e impedir o sigilo nas conversas entre advogados e prisioneiros, para que a paz se faça. Evidentemente que não pretendem impedir o sigilo dos negócios de alguns banqueiros, que se encontroam sub judice, como o misterioso Daniel Dantas.

Duas são as causas básicas da crise nacional, atadas uma a outra como irmãs siamesas: a brutal desigualdade social e a corrupção do Estado e da sociedade, e que se agravou desde os governos militares. É necessário, portanto, reconstruir estado a partir de suas bases ou seja, dos municípios.

22 maio 2006

 


Danos colaterais
Mauro Santayana
22/05/2006

Se, entre os prováveis inocentes tombados sob os tiros da polícia, em São Paulo, houvesse algum morador dos Jardins, outra seria a reação de nossas bravas elites. Disse José Serra, em artigo publicado pela Folha de São Paulo, que o inimigo é a criminalidade, e não devemos especular pelas causas sociológicas dos delitos, mas sim concentrar o combate aos bandidos. Se o ex-prefeito de São Paulo, e candidato ao governo do Estado, houvesse recomendado com o mesmo rigor o combate aos representantes das elites econômicas que, no exercício do poder político, roubaram do povo, enviaram dinheiro para o exterior, em todos os governos – e nunca foram devidamente punidos pelos crimes cometidos – perderia muitos de seus eleitores ricos.

As maiores vítimas de qualquer guerra são sempre as mesmas:aquelas que se encontram longe das trincheiras. E quando a guerra é social, por mais não queiram os tucanos aceitar essa evidência, as maiores vítimas da matança são os pobres. Com exceção da Polícia Federal, que vale a pena ser registrada, a polícia não invade o reduto dos afortunados, a fim de algemar os respeitáveis burgueses e seus representantes parlamentares. Os policiais vão ás favelas, para matar a esmo, como as repetidas chacinas comprovam. Sitiam e abatem meninos e meninas, que dormem nas ruas, como fizeram na chacina da Candelária.


À sombra do medo em flor
Fausto Wolff
22/05/2006

Em seguida, os políticos pedem “responsabilidade criminal aos 16 anos”. Logo pedirão responsabilidade aos 15, 14 e cosi via. Cosi via significa que aumentará o número de crianças assassinadas ao nascer; aceitação literal da loucura religiosa de que o homem já nasce pecador. Claro que essa lei só valera para crianças pobres.

Como vejo a coisa hoje ? Dêem a chefia da portaria de um edifício ao mais dócil dos empregados e logo ele se tornará um tirano para agradar ao poder imediatamente acima dele. O poder ama a si mesmo e aos poderosos. É tão implacável na sua injustiça que consegue convencer 100 milhões de brasileiros adultos de que devem escolher entre o algoz da esquerda e o da direita.

O mito de Fausto
Mauro Santayana
21/05/2006

A civilização contemporânea lembra o convênio entre o Doktor Faustus, de Frankfurt, e o grande ministro do Inferno, como o descreveram Marlowe e Goethe. Não sabemos se os homens serão capazes de fugir ao contrato, ou se ouvirão sempre o anjo infernal que aconselhava Fausto a pensar apenas na glória e na riqueza – até que o mundo seja entregue definitivamente ao demônio em corpo e alma.

O que vem acontecendo em São Paulo exige mais do que as providências repressivas que a população está exigindo do Estado. Exige profundo exame de consciência da sociedade. De nada adiantam aos banqueiros os lucros imensos, obtidos com voracidade, e que custam o suor e o sangue dos pobres, se não podem caminhar nas rias de seu próprio pais, sem guarda-costas e sem medo. De nada adianta às famílias de classe média o conforto pessoal, sem caminham nas ruas sem ver no outro o próximo, o seu semelhante, com o qual possam compartilhar a alegria de viver – mas, sim,o provável seqüestrador, o possível trombadinha, o eventual assassino.

19 maio 2006

 

Os anões e a elite
Clóvis Rossi
19/05/2006

No meio dos anões, emerge com a análise correta o governador Cláudio Lembo ao culpar a mesquinharia da "elite branca" pela crise. Sim, foi essa elite que fez todos os governantes dos últimos 500 anos, que depôs os que pareciam contrariá-la, ainda que tivessem idêntico berço, e que, passada a moda da deposição, cooptaram os que originalmente a ela não pertenciam, caso específico de Luiz Inácio Lula da Silva.

Pena que Lembo seja a prova definitiva da mesquinharia da elite: só descobriu seus podres agora que está no ocaso. Antes, passou a vida a serviço dela, gostosa e gloriosamente. Pobre país.


Keynes, nos ajude de novo
Luiz Carlos Mendonça de Barros
19/05/2006

Vivemos hoje um conflito semelhante entre os valores do mundo financeiro e os do chamado lado real da economia. Converse com alguém ligado ao primeiro e terá uma visão extremamente otimista de nossa economia; visite uma zona rural ou as associações ligadas à indústria brasileira e o quadro muda de cor, de rosa para negro. Olhada a economia brasileira pelo lado da solvência, principalmente a externa, realmente vivemos dias de muita segurança e glória. Afinal, em poucos anos poderemos ser um país sem dívida externa. O Banco Central acumula reservas de uma forma extraordinária e, ainda, recompra títulos de nossa dívida externa no mercado, reduzindo, com isso, os riscos de uma crise externa, como ocorreu com freqüência no passado. Mas o outro lado dessa equação, isto é, o custo da acumulação de reservas em um ambiente de juros reais de 10% ao ano, é uma ameaça real para a atividade econômica.

18 maio 2006

 

“Nós temos uma burguesia muito má, uma minoria branca muito perversa.
Nossa burguesia devia é ficar quietinha e pensar muito no que ela fez para este país. É um país que quando os escravos foram libertados, quem recebeu indenização foi o senhor, e não os libertos, como aconteceu nos EUA. Então é um país cínico. É disso que nós temos que ter consciência.
A bolsa da burguesia vai ter que ser aberta para poder sustentar a miséria social brasileira no sentido de haver mais empregos, mais educação, mais solidariedade, mais diálogo e reciprocidade de situações.”

Cláudo Lembo
(governador de São Paulo)
18/05/2006


16 maio 2006

 


Pânico no galinheiro
Demétrio Magnoli
16/05/2006

O PCC deflagrou ontem a guerra da informação. Existiram, aqui e ali, disparos reais, mas sobretudo os bandidos dispararam aleatoriamente chamadas telefônicas ameaçadoras. BUUU! A cidade de São Paulo reagiu como um imenso galinheiro. Rumores correram soltos, desatando reações em cadeia. Sob o influxo do boato, comerciantes baixaram portas de aço, pais assustados correram às escolas para resgatar as crianças e empresas suspenderam o serviço. De um bairro a outro, a cidade apagou-se ao longo da tarde.

Sarajevo, a capital da Bósnia-Herzegóvina, não renunciou à vida, nem sob sítio e debaixo das rajadas de franco-atiradores. Os mercados de Bagdá funcionaram em meio aos estrondos das bombas e mísseis dos ataques norte-americanos. Londres não parou durante os bombardeios aéreos alemães, na Segunda Guerra Mundial. Mas São Paulo curvou-se à delinqüência comum. Vergonha!

A culpa é só dos governantes? Não, mil vezes não! São Paulo conheceu ontem os efeitos psicológicos da indústria do medo. A classe média que não deixa os seus filhos circularem de ônibus e metrô, que se cerca de câmeras e alarmes, que passeia apenas em shopping centers e aspira comprar um automóvel blindado correu na direção de seus bunkers domésticos murmurando tolices sobre a pena de morte. No começo da noite, um manto de silêncio desceu sobre a cidade. Vergonha!

 



Um dia de cão
Luís Nassif
16/05/2006

Todas as recomendações dos especialistas são que a maneira mais eficaz de estrangular o crime organizado é cercear suas atividades financeiras de duas maneiras: impedindo a circulação de dinheiro e coibindo as atividades que, de alguma forma, possam estar ligadas ao crime organizado.

No plano federal, o Banco Central do governo Lula ampliou enormemente as facilidades para a remessa de dinheiro para o exterior. Por aqui, pratica-se lavagem de dinheiro a céu aberto. Na semana passada, era possível ler em vários jornais o grande banqueiro de investimentos vangloriando-se de possuir centenas de milhões de dólares em paraísos fiscais, nas barbas do Ministério Público e da Secretaria da Receita Federal deste país. Pelos dutos que passa o dinheiro frio, passa também o dinheiro de origem criminosa.

No plano estadual paulista, um projeto de lei visando coibir as atividades dos bingos e máquinas de apostas -apontadas por muitos especialistas como caminho para a lavagem de dinheiro do crime organizado- foi vetado pelo ainda governador Geraldo Alckmin.

13 maio 2006

 

  • "Os contratos são ilegais e inconstitucionais. Se você quer saber da Petrobras, posso dizer como ela operava ilegalmente, sem respeitar as normas bolivianas. Há muitas denúncias de empresas petroleiras que não pagam impostos, que são contrabandistas. De que segurança jurídica essas empresas e seus países podem falar?"

    Evo Morales

    11/05/2006

10 maio 2006

 




  • “Sobre essa entrevista, não sei mais onde está verdade. O que eu falei ali, o que era verdadeiro, não sei mais (...). Não sei de onde eu tirei isso, se foi de imprensa, se foi da minha cabeça. Não estou dizendo que eu não disse. De onde eu tirei, não sei mais”.

    Silvio Pereira
    (ex-secretário-geral do PT
    em depoimento à CPI dos Bingos)
    10/06/2006

09 maio 2006

 

Nosso dever para com a Bolívia
Roberto Mangabeira Unger
09/05/2006

A reação da parte endinheirada e cosmopolita da sociedade brasileira contra a nacionalização das instalações de petróleo e de gás na Bolívia revela a miopia, a mesquinharia e o mercantilismo que pervertem a discussão da política exterior no Brasil.

A Bolívia, sob governos anteriores, repudiados pelo povo boliviano como entreguistas, contratou para vender ao Brasil gás por menos da metade do preço pelo qual ele comumente se vende no mundo. Sucessivos governos brasileiros preferiram continuar dependendo do gás boliviano a desenvolver a base energética brasileira.

A política exterior é ramo da política, não ramo do comércio. Na política exterior das democracias, realismo e idealismo se comunicam e se reforçam. E nenhum país ascende no mundo, ou sequer enriquece, subordinando interesses estratégicos duradouros a interesses comerciais passageiros. Não tem o Brasil interesse mais importante do que acalentar a integração sul-americana, afastando, para preservá-lo, a sombra de qualquer subimperalismo brasileiro.

Que os ventos soprando sobre as selvas e os cerrados brasileiros tragam ao povo triste e forte do altiplano, desfalcado de tudo, menos de dignidade, a verdadeira voz do Brasil: irmãos, sua libertação é nosso engrandecimento.

08 maio 2006

 

“Afinal, o Brasil tem sentido ? Implícita ou mesmo explicitamente, há vários anos as elites e seus representantes nos dizem que não; por todos os meios, difundem esse sentimento pelo país. Nós dizemos que sim.”

“O modelo atual não tem potencial estruturante para a sociedade brasileira no longo prazo, e esta sociedade tem fundamentos suficientemente sólidos para não se deixar desconstruir. No passado, as elites só puderam ser tão conservadoras na área social porque o país apresentava grande dinamismo na área econômica. Com a perda dessa característica, as transições controladas, que em cada momento alteraram e conservaram as estruturas sociais, já não serão eficazes. É questão de tempo que um novo projeto amadureça – menos tempo do que normalmente se supõe. Aproxima-se a vez de uma grande mudança.”

“A Opção Brasileira”
César Benjamin

07 maio 2006

 


  • “Vão me matar. Eles vão me matar, você não entende.
    Não faça isso comigo. Tem muita gente importante envolvida nisso.”

    Silvio Pereira
    (ex-secretário-geral do PT,
    após entrevista ao jornal O Globo)
    07/06/2006

 

A Petrobras brinca de rainha Victoria
Elio Gaspari
07/05/2006

Entre 1864 e 1871, a Bolívia foi governada pelo general Mariano Melgarejo, uma espécie de sósia de Evo Morales, de cabeça para baixo. O general era careca e tinha uma vasta barba. O embaixador inglês em La Paz desgostou o presidente. Pode ter sido porque se recusou a beijar o traseiro da amante do general ou porque não quis apresentar credenciais a uma mula. Melgarejo mandou que tirassem a roupa do inglês e o colocassem na sela de um burrico, para divertimento dos bolivianos.

Esse é o lado latino-americano da história. Agora, o europeu:

Quando a humilhação imposta ao diplomata chegou ao conhecimento da rainha Victoria, ela determinou ao primeiro-ministro Palmerston que bombardeasse La Paz. Veio a informação de que, encarapitada na cordilheira, a Bolívia estava fora do alcance das canhoneiras inglesas. Victoria pediu que trouxessem um mapa. Quando mostraram-lhe onde ficava o país, ela riscou o mapa com um golpe de pena e anunciou: "A Bolívia não existe mais".
Toda bravata boliviana ecoa o general Melgarejo, mas as respostas arrogantes da Petrobras ecoam a pretensão da rainha Victoria.

 

A EBX é coisa nossa
Luís Nassif
07/05/2006

Bom, agora Eike atravessou a fronteira. Sua EBX está em Corumbá pleiteando uma licença ambiental para se instalar no lado brasileiro. Ou seja, virou uma questão interna do Brasil.

Assim como na Bolívia, a empresa pretende utilizar carvão vegetal, madeira. O Estudo de Impacto Ambiental - Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) fala em consumo de 225 mil toneladas/ano de carvão vegetal. Mas nem sequer menciona a origem do carvão, se de florestas trabalhadas, se de madeira nativa.

A Promotoria Pública Estadual convocou especialistas da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul e da Embrapa Pantanal para opinar sobre o EIA-Rima da EBX. Na quinta-feira passada, deveria ocorrer uma audiência pública em Corumbá. O que se viu foi um amplo processo de intimidação dos pesquisadores, uma arruaça insuflada por políticos locais, semelhante à que ocorreu em Puerto Quijarro. Carros de som passaram a percorrer a cidade com slogans ameaçadores, desde "fora ambientalistas!" até um "vamos expulsá-los à bala!". E tinham o logotipo da prefeitura.


Em seu parecer, a professora Sonia Hess havia chamado a atenção das autoridades ambientais: "Se não houver exigências por parte dos órgãos ambientais, para que os empreendedores documentem claramente quais os fornecedores que serão contratados para o fornecimento do carvão vegetal e de onde os mesmos obterão a madeira necessária, a implantação dos empreendimentos siderúrgicos previstos deverá colocar em risco os remanescentes de vegetação nativa de MS, que, literalmente, vão virar carvão e cinzas".

 

Agressividade irracional contra a ação de Morales
J. Carlos de Assis
07/06/2006

O que está acontecendo na Bolívia já aconteceu na Venezuela, na Argentina, no Equador e no Peru. O problema não é tanto de nacionalização e estatização de recursos naturais, embora isso conte como meio, mas de redefinição dos objetivos de soberania nacional, enquanto fins. Foi a estupidez neoliberal que levou grande parte da América do Sul a esses limites, e o que estamos vendo não passa de conseqüência do troco que se dá à idéia de que o mercado e o neoliberalismo darão conta de nossas necessidades de desenvolvimento. Não deram e não vão dar.

Nesse contexto, o Brasil está obviamente atrasado, e de uma forma ambígua. O Governo Lula, que poderia ter sido o instrumento inaugural desse processo de retomada da consciência nacional da América do Sul, ficou retardado em razão de compromissos esdrúxulos com o sistema financeiro interno e internacional.

Parte da grande imprensa brasileira, por sua associação com o capital financeiro especulativo, teme mortalmente a onda anti-neoliberal que se levanta na América do Sul. Daí o ódio a Chavez, da Venezuela, a ridicularização de Kirchner, na Argentina, e a tentativa de detração de Evo Morales.

06 maio 2006

 


Os adversários da América do Sul têm o seu projeto: criação da Área de Livre Comércio das Américas; dolarização progressiva do continente; desnacionalização das economias e dos recursos naturais; transformação dos Estados nacionais em reféns do sistema financeiro internacional; isolamento ideológico e enfraquecimento das forças armadas; presença militar crescente dos Estados Unidos, especialmente na região amazônica; cooptação das elites pensantes e controle dos meios de comunicação de massa.

Mas, em quase todos os países, forças políticas cada vez mais representativas reconhecem que um projeto sul-americano alternativo é necessário e viável. Elas vêm obtendo sucessivas vitórias. Está no fim o ciclo da aventura neoliberal. Inicia-se um novo período da nossa existência.

O projeto sul-americano reforçará as tendências, já existentes, que apontam para o trânsito da unipolaridade para uma nova multipolaridade na geopolítica mundial. É preciso defini-lo com clareza e viabilizá-lo politicamente. O papel do Brasil é insubstituível. Precisamos deixar para trás a posição ambígua que temos tido e assumir claramente que a unidade da América do Sul tem de ser um elemento-chave da nossa política externa.

César Benjamin
“Nossa América”

05 maio 2006

 


César Benjamin
“Caminhos da transformação (uma abordagem teórica)”

Marx concluiu que o capital procuraria ampliar suas possibilidades de acumulação na forma D – D’, na qual ele nunca deixa de existir como riqueza abstrata. E anteviu, com grande ousadia: quando essa forma se tornasse predominante, a civilização do capital entraria em crise. Pois, ao repudiar as “coisas”, o trabalho e a atividade produtiva, ao afastar-se do mundo-da-vida, a acumulação de capital não poderia mais ser o eixo em torno do qual a vida social se organiza. A forma-mercadoria – que, levada às últimas conseqüências pelo capitalismo, havia reorganizado profundamente as sociedades humanas e impulsionado o desenvolvimento da técnica – teria então de ser superada ou, pelo menos, remetida novamente a um lugar secundário, cedendo a vez a algum outro princípio de organização da vida social.

O fim do capitalismo, assim concebido, não decorre do aumento nos níveis absolutos de exploração do trabalho. É de uma crise civilizatória muito mais ampla que agora estamos tratando. Marx não precisaria estudar tanto, nem ter grande talento, para anunciar a superação de um sistema que, a partir de certo ponto, não pudesse mais funcionar ou causasse o empobrecimento permanente dos trabalhadores. Nesse caso, o desenlace seria óbvio. O gênio de Marx foi ter percebido que o capitalismo se esgotaria, mesmo dando certo. Ou melhor: se esgotaria justamente por dar certo, por desenvolver plenamente suas potencialidades.

O capitalismo venceu. Estamos, finalmente, em um sistema-mundo em que tudo é mercadoria, em que se produz loucamente para se consumir mais loucamente, e se consome loucamente para se produzir mais loucamente. Produz-se por dinheiro, especula-se por dinheiro, faz-se guerra por dinheiro, mata-se por dinheiro, corrompe-se por dinheiro, organiza-se toda a vida social por dinheiro, só se pensa em dinheiro. Cultua-se o dinheiro, o verdadeiro deus da nossa época – um deus indiferente aos homens, inimigo da arte, da cultura, da solidariedade, da ética, da vida do espírito, do amor. Um deus que se tornou imensamente mediocrizante e destrutivo. E que é insaciável: como vimos, a acumulação de riqueza abstrata é, por definição, um processo sem limites.

O capitalismo venceu. Talvez, agora, possa perder. Pois, antes que o novo possa surgir, Hegel dizia, é preciso que o antigo atinja a sua forma mais plena, que é também a mais simples e mais essencial, abandonando as mediações de que necessitou para desenvolver-se. O momento do auge de um sistema, quando suas potencialidades desabrocham plenamente, é o momento que antecede seu esgotamento e sua superação.

 

A EBX e o interesse nacional
Luís Nassif
05/05/2006

A assessoria de Eike fez a gentileza de me remeter o relatório que supostamente atestaria a legalidade da operação de Eike na Bolívia. Pelo relatório, fica-se sabendo que a EBX se instalou em Puerto Quijarro, próximo à fronteira do Brasil. A licença de construção foi concedida pela resolução 003 de junho de 2006 (provavelmente deve ser junho de 2005), pelo município de Puerto Quijarro, "tendo sido posteriormente encaminhada ao Ministério de Minas e, finalmente, ao vice-ministro do Meio Ambiente". Ora, o simples fato de o município encaminhar o pedido ao governo federal revela o óbvio: que ele não era a autoridade adequada para conceder a licença ambiental.

No dia 17 de janeiro de 2006 -ainda de acordo com os documentos da EBX-, Evo Morales promulgou um novo regulamento ambiental. A licença ambiental solicitada pela EBX foi rejeitada em 17 de março de 2006. Segundo o relatório, a EBX considera que o novo regulamento ambiental não é aplicável ao seu caso, pelo fato de a licença ter sido solicitada antes, em 2005. Ora, pelo próprio documento a licença não tinha sido concedida e já havia quatro fornos implantados.


Além de ter se instalado irregularmente -porque confessadamente sem licença ambiental-, em um ambiente conturbado como o boliviano, a EBX ajudou a botar coque na fornalha, jogando a Província de Santa Cruz contra o Executivo federal.

 

Bolívia sugere ao Brasil reduzir impostos sobre o gás
Tribuna da Imprensa
05/05/2006

A Embaixada da Bolívia em Brasília disparou um ardiloso recado na manhã de ontem, pouco antes do início do encontro dos presidentes brasileiro e boliviano em Puerto Iguazú. Na lógica de La Paz, o aumento de preços do insumo reivindicado pelo governo boliviano poderia ser compensado no Brasil por meio da redução da carga tributária sobre o gás natural. Ou seja, mesmo com um aumento dos preços cobrados pela Bolívia, o produto continuaria economicamente atrativo ao consumidor final brasileiro e não acarretaria sérios impactos na produção do Sudeste e do Sul e nos índices de inflação.

04 maio 2006

 

  • “Não temos uma teoria do Brasil contemporâneo.
    Estamos em vôo cego, imersos em uma crise de destino, a maior da nossa existência.

    A História está nos olhando nos olhos, perguntando:

    “Afinal, o que vocês são? O que querem ser? Tem sentido existir Brasil? Qual Brasil?”

    César Benjamin
    “Uma certa idéia de Brasil”

 


A Bolívia e a escorregadia trilha do ridículo
Fausto Wolff
04/05/2006

Aliás as últimas eleições na Bolívia foram mais do que simples eleições. Foram um plebiscito sobre a estatização. E venceram com sobra os nacionalistas, os 75% de povo índio. O que queriam nossas corajosas “esquerdas” e “direitas”, tão habituadas às declarações de mentirinha nas campanhas presidenciais ? Achavam que Morales era um Lula que prometeu reforma agrária, estatização, fim da fome para seguir a cartilha neoliberal ditada por Washington enquanto seus comparsas saqueavam o país ?

O Brasil recuperará o bilhão de dólares que investiu na Bolívia. Certamente não recuperará os bilhões de dólares do valerioduto e os milhões doados a Garotinho pelo Garotinho, o novo Ghandi.

 

As razões de Morales
Luís Nassif
04/05/2006

Antes de pretender lançar os "marines" brasileiros para sufocar a ação de Morales, seria conveniente entender direito o que ocorre na Bolívia. O país tem enormes riquezas minerais e uma pobreza africana. As riquezas naturais sempre foram vistas como o caminho para sua redenção social e econômica, e sua nacionalização foi claramente explicitada no programa de campanha de Morales.

E, aí, tem que se haver com os três pilares que dão sustentação ao seu governo. O primeiro é o chamado "circulo palaciano", formado por um grupo de intelectuais responsáveis pela administração do governo. São três nomes fortes: Juan Ramón Quintana, ministro da Presidência, Alfredo Rada, vice-ministro de Coordenação com Movimentos Sociais, e Héctor Arce, vice-ministro de Coordenação Governamental.O segundo pilar são as populações indígenas, de onde vêm a força e as lealdades maiores a Morales. No ministério, esse setor é representado por David Choquehuanca. O terceiro pilar são as centrais sindicais, cujo homem de confiança de Morales é o líder camponês Román Loayza.

No plano da estratégia continental, o desenvolvimento econômico e social do continente e a estabilização política dependem mais do que nunca da integração econômica e física. E esse processo passa pelo desenvolvimento equilibrado entre todos os países. Não se trata de questão ideológica. É uma inevitabilidade, independentemente dos governos de plantão. É essa integração que criará zonas de desenvolvimento e permitirá montar metas continentais, da mesma maneira que na União Européia.

03 maio 2006

 


“Além de vasta cultura e honradez intelectual, Gilberto, Sérgio, Caio, Celso, Darcy e tantos outros, mesmo alinhando-se a correntes teóricas e políticas muito diferentes, mesmo propondo interpretações diversas, tinham uma coisa fundamental em comum: gostavam do Brasil. Desejavam do fundo da alma que o país desse certo e a isso dedicaram suas vidas e seus melhores esforços. Tal sentimento transparece em cada linha que escreveram, em cada gesto que fizeram, em cada palavra que disseram. Havia generosidade neles. Eis aí outra mudança importante: evidentemente, manifestamente, cinicamente, quase explicitamente, os formuladores e divulgadores do novo discurso hegemônico não gostam do Brasil. Gostam de business. O que estamos ouvindo deles, todo o tempo, é que o Brasil, como sociedade, nação e projeto, não tem sentido nenhum. Atrapalha. A esperança-Brasil deu lugar ao risco-Brasil.”

César Benjamin
“Uma certa idéia de Brasil”

 

As lacunas capitais do PT
Ricardo Antunes
03/05/2006


A segunda lacuna capital do PT (e de seu governo) foi sua corrosão política. Se, em sua origem, o partido encontrava viva ancoragem nas lutas sociais e sindicais, pouco a pouco foi abandonando seu traço genético e abraçando crescente e avidamente a pauta institucional, dando centralidade cada vez maior aos embates eleitorais. E, com isso, foi se consolidando algo a que o PT era avesso, isto é, uma política de alianças cada vez mais desvertebrada e policlassista, que chegou a flertar com núcleos mais duros da direita brasileira, como foi o caso de Maluf em São Paulo.

 

Evo tem o direito até de errar
Clóvis Rossi
03/05/2006

A nacionalização do gás boliviano pode ser certa ou errada, conforme o gosto de cada qual, mas tem um aspecto que precisa ser ressaltado: trata-se de cumprimento de contrato, coisa que os liberais, hoje hegemônicos, sempre exigem. Que contrato? O contrato entre candidato e eleitor, que deveria ser sagrado na democracia. Evo Morales prometeu, na campanha, nacionalizar os recursos minerais. O eleitorado "comprou" a promessa e lhe deu a vitória. Está agora fazendo apenas o que prometeu. Democracia é assim. Pena que parte dos que se dizem democratas só gosta de quem cumpre as promessas que lhes agradam. Enamoraram-se, por exemplo, de Luiz Inácio Lula da Silva porque tudo o que prometeu em 23 anos de vida partidária -e que desagradava ao liberalismo- virou "bravata" depois de eleito. É assim que começa a corrupção. Pela corrupção da palavra empenhada.

02 maio 2006

 

Carta à Coordenação Nacional da Consulta Popular
César Benjamin
Rio de Janeiro, 26 de abril de 2006

Comecei a reconhecer-me como militante de esquerda em 1967. São quase quarenta anos. Quase todo o meu tempo de vida. Nos últimos meses, pela primeira vez, como alguns de vocês já sabem, tenho avaliado a possibilidade de me afastar, mesmo temporariamente. Tenho sentido a necessidade de buscar pontos de vista mais amplos.

A causa é a grave inflexão por que passou a esquerda brasileira. Em sua história, ela já correu muitos riscos. Em alguns momentos quase foi eliminada fisicamente. Porém, mesmo em minoria, mesmo fora de governos, mesmo perseguida, mesmo errando, aqui e em outros países, sempre concebeu para si um papel de vanguarda intelectual e moral. Isso foi decisivo para a sua auto-estima e sua sobrevivência, geração após geração.

A situação, agora, é inversa: sem saber como enfrentar um processo inédito – a dissolução de dentro para fora –, a esquerda corre o risco sair da história, mesmo que continue a existir fisicamente. Pois só mantêm-se, como forças vivas, movimentos que têm idéias e utopias.

Foi esse o patrimônio que perdemos. Vocês são testemunhas de que paguei alto preço para tentar preservá-lo.

“Se Deus não existe”, dizia Dostoiévski, “tudo é possível”. Nos últimos anos, gradativamente, tudo foi se tornando possível, com a cumplicidade de muitos, até que chegamos ao fundo do poço.

Hoje, bancos e empreiteiras fazem repasses milionários, regularmente, para o maior partido da esquerda brasileira, que passou a depender desses recursos para sobreviver. Importantes dirigentes atuam abertamente como lobistas de grandes empresas. Outros recorrem à Justiça para obter garantia do direito a mentir. O mais poderoso ministro do governo de esquerda, no exercício do cargo, prostituía meninas. A militância é vista como uma forma de ascensão social.

Há trinta anos, isso seria impensável entre nós. Há vinte anos, estaríamos diante de escândalos. Há dez anos, seriam motivos de inquietação e debate. Hoje são apenas fatos da vida. A traição perdeu a modéstia, e a esquerda passou para a retaguarda intelectual e moral da sociedade, uma grave inflexão.

Eu não sou desse tempo. E tenho memória. Por isso, retirei-me há mais de dez anos do PT e estou reavaliando caminhos.

Mas a vida é tinhosa. Justo nesse contexto de recolhimento, tristeza e reflexão recebi o convite inesperado, que agora vamos debater. Devemos debatê-lo com o coração aberto, pensando grande.

01 maio 2006

 

  • “Os discursos de quem não viu, são discursos.
    Os discursos de quem viu, são profecias.”

    Antônio Vieira
    "Sermão da Terceira Dominga do Advento"

    1669

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