31 janeiro 2006

 

A direita tem vergonha de si mesma
Miltom Temer
31/01/2006

É a esquerda quem os molesta, quando repele a forma mentirosa com que se pretende vender melhoria de distribuição de renda e criação de empregos, nos termos em que, semana passada, os grandes meios de comunicação distorceram o noticiário sobre a última pesquisa do IBGE. Somente o JB teve a honestidade de mostrar que não houve redução do desemprego. O que caiu foi o número dos que procuram trabalho. Ou seja; se de dez desempregados, oito desistiram de procurar emprego, isto não quer dizer que o desemprego reduziu-se de 10 para 2%. Mas, sim, que o desencanto definitivo subiu de zero a oito. Quem é de esquerda, denuncia. Quem é de direita, festeja.

 

Depois da cartilha
Roberto Mangabeira Unger
31/01/2006

Nossas elites descobriram que o Brasil, e com ele a maior parte da América latina, vive 25 anos de estagnação, sofrendo declínio lento, porém progressivo e constante, de sua posição relativa no mundo. Uma nação que se destaca pela vitalidade veste camisa-de-força. Esses fatos, universalmente conhecidos, só convenceram quando trazidos como notícias de Davos e registrados na imprensa estrangeira.

E a reação a essa descoberta tardia? A mesma de sempre: precisamos de mais "flexibilidade", menos gasto, mais paciência. Não falta proposta. Só falta eficiência na execução. Interpretam-se as experiências -tão contrastantes com a nossa- da Índia e da China de maneira a resguardar a fé na cartilha. Desconsidera-se o ponto essencial: a libertação de forças de mercado foi combinada na China com a mobilização maciça de recursos nacionais, na Índia, com a formação de milhões de técnicos e cientistas e em ambos aqueles países com ousadia despreconceituosa na maneira de organizar a economia de mercado e de associar o poder público com a iniciativa privada.


Nossos privilegiados não mudarão de idéia. Morrerão convencidos de que fizeram tudo certo; culparão o país. A confiar no que se diz e se pensa entre eles, será preciso esperar que a geração seguinte traga das universidades estrangeiras a notícia de que lá ninguém mais leva a sério as idéias por que nos pautamos aqui. Não dá para aguardar esse desdobramento: o Brasil terá continuado ladeira abaixo, desperdiçando milhões de vidas e de talentos.

30 janeiro 2006

 

Ms. Kate
João Sayad
30/01/2006


Paul Samuelson, Nobel de Economia, batia à máquina mais depressa e com menos erros do que a secretária Miss Kate. Não demitiu a secretária. Resolveu se especializar-ele ficava com a economia, ela, com a datilografia. Apesar de ser melhor que a Kate em economia e datilografia, era muito melhor em economia do que na máquina de escrever. Usou o princípio das vantagens comparativas.


A teoria das vantagens comparativas não trata da questão mais difícil: Kate deveria estudar economia? Hoje em dia, Samuelson escreve e corrige seus trabalhos com facilidade no computador. Se ela tivesse estudado economia, estaria ganhando melhor. Samuelson continua com a secretária apenas por questões de amizade.

 

O que está por trás da queda do desemprego
J. Carlos de Assis
30/01/2006

As pessoas marginalmente ligadas à PEA, como são definidas as não economicamente ativas (17 milhões 242 mil nas seis regiões) que querem e estão disponíveis para trabalhar, e não conseguem, passaram de 936 mil em novembro para 1 milhão 160 mil em dezembro. Um aumento de nada menos 224 mil desempregados que ficam escondidos nas estatísticas da desocupação.


Se esses desocupados reais forem levados em conta, a taxa de desemprego passa de 8,3% para 9,3%, apenas 0,3 ponto percentual abaixo de novembro. Esse 0,3 ponto percentual pode ser explicado de forma bastante plausível pela sazonalidade de dezembro. De fato, quando se observa o comportamento dos diferentes setores, verifica-se que o cai o emprego na indústria, na construção, na administração e nos serviços públicos, e até nos serviços domésticos. O que cresce é o emprego no comércio e na intermediação financeira. Em suma, o desemprego realmente não caiu. Apenas mudou de endereço.

29 janeiro 2006

 

A indústria estéril da arbitragem
Luis Nassif
29/01/2006

O sábio recluso me escreve de novo. Andou analisando a indústria da arbitragem de juros, criada pelo Plano Real e mantida pelo governo Lula. Consiste em trazer dólares de fora, a um custo baixo, e aplicar aqui em títulos públicos, à taxa Selic, sem risco, tudo garantido pelo Banco Central.


Ele compara esse ciclo de rendimentos parasitários às lavras de ouro e de diamantes, nos primórdios da colonização, e ao tráfico de escravos, negócio central do capitalismo brasileiro por 200 anos, estabelecendo em torno dele um anel de negócios paralelos de navegação, bancos e seguros.

Tome-se o exemplo:

1. O investidor pegou um empréstimo de US$ 10 milhões no exterior e entrou no Brasil no início de 2003, com o dólar a R$ 3,50. Converteu e aplicou R$ 35 milhões em papéis Selic por três anos, a uma média de rentabilidade de 20% ano (apenas para exemplificar).

2. No primeiro ano os papéis valiam R$ 42 milhões; no segundo ano, R$ 50,4 milhões; no terceiro ano, R$ 60 milhões.

3. No resgate, ele pode recomprar os dólares a R$ 2,25, ficando com US$ 26,66 milhões. Pagou os US$ 10 milhões do empréstimo, mais US$ 2,5 milhões de juros. Seu lucro foi de US$ 14,1 milhões, quase uma vez e meia seu capital inicial, em apenas três anos, além do rendimento de sua aplicação original que lastreou o empréstimo.


 

A banca e Serra
Elio Gaspari
29/01/2006

O Banco Votorantim, onde brilha a caneta do empresário Antônio Ermírio de Moraes, produziu uma análise da situação política. Disseca os candidatos a presidente da República e, entre os seis "pontos vulneráveis" de José Serra, diz o seguinte: "Incerteza sobre ações de eventual governo (passado de esquerda), voluntarioso, independente e com discurso desenvolvimentista".


Desde que os florentinos criaram as casas de crédito, é a primeira vez que um banco tem coragem de dizer que independência é vulnerabilidade. Se o doutor Antônio Ermírio sair pelo país dizendo isso, Serra está eleito.

28 janeiro 2006

 

"A China decide o que quer fazer nos dez anos à frente. E faz.
No Brasil, há um monte de economistas debatendo por que não dá para fazer.
A gente não tem o que falar. Dá vergonha."

Alain Belda
Brasileiro, presidente mundial da Alcoa
( o maior produtor de alumínio primário )

"deixamos de ser problema, ou problema potencial, ou risco"

Henrique Meirelles
presidente do Banco Central

27/01/2006
no Fórum Econômico Mundial em Davos

“sem fé em si mesma, sem fé no povo, rosnando para os de cima, tremendo diante dos de baixo, egoísta em relação aos dois lados e consciente de seu egoísmo, revolucionária contra os conservadores, conservadora contra os revolucionários, desconfiada de suas próprias palavras de ordem, frases em lugar de idéias, intimidada pela tempestade mundial, mas dela desfrutando – sem energia, em nenhum sentido, plagiaria em todos os sentidos, vulgar porque não era original e original na vulgaridade – traficando com seus próprios desejos, sem iniciativa, sem fé em si mesma, sem fé no povo, sem missão histórico-mundial...”

A Burguesia e a Contra-Revolução
Karl Marx

 

A ruptura definitiva do pensamento único
J. Carlos de Assis
28/01/2006

O Forum Social Mundial é importante porque existe. É um sinal de vida política independente no mundo, num momento da história mundial em que a política estava sendo reduzida a um papel coadjuvante do aparato de dominação neoliberal. O surgimento do Fórum em Porto Alegre, há cinco anos, constituiu-se numa ruptura com o pensamento único, e, por conseqüência, com o pretendido congelamento das relações políticas nos países do Terceiro Mundo, e entre eles, nos termos do Consenso de Washington.

Fórum Social Mundial ultrapassou largamente seu papel de denúncia de Davos como um esquema ideológico e político de dominação social e de congelamento de relações sociais e econômicas no planeta. Abriu perspectivas concretas para o reconhecimento e avaliação de alternativas. Nunca será, como eu própria erradamente esperava, um espaço propositivo unitário. É um espaço da crítica, da reflexão apaixonada, e, sobretudo, da criatividade. Não se espere que dali surja um único caminho. Serão muitos. As sociedades é que terão de escolher o que melhor lhe convém.

26 janeiro 2006

 

"Em cada época marcante de sua história, a sociedade brasileira tem sido levada a pensar-se novamente. É como ela se debruçasse sobre si mesma: curiosa, inquieta, atônita, imaginosa. Não só se formulam novas interpretações como se renovam as anteriores. "

"Acontece que o presente problemático, difícil ou inovador, desafia o entendimento da sociedade, as explicações conhecidas. "

"As forças sociais predominantes em cada época são levadas a pensar os desafios com os quais se defrontam, os objetivos que pretendem alcançar, os aliados e opositores com os quais negociar, os interesses próprios e alheios que precisam interpretar. Ao pensar o presente, são obrigadas a repensar o passado, buscar e rebuscar continuidades, rupturas e inovações. Mesmo quando pretendem o futuro, são postas a pensar outra vez o passado, acomodá-lo ao presente, ou até mesmo transformá-lo em matriz do devir"

A Idéia de Brasil Moderno
Octávio Ianni


25 janeiro 2006

 


"Francisco de Oliveira recorreu ao ornitorrinco para retratar a tragédia brasileira. Oriundo da Austrália, o monstrengo tem bico de pato, é ovíparo, guardando a aparência de uma mescla de réptil com mamífero. Tão estranho e feioso é o bicho que a pena sarcástica de Melville (vale lembrar que é de sua safra a máxima sobre o tucanato: ‘bela plumagem e carne ruim !’) nos lembra que, quando um ornitorrinco empalhado apareceu pela primeira vez na Inglaterra, os estudiosos das ciências naturais, perplexos, não conseguiram acreditar que aquele animal existia na realidade, acrescentando que seu bico era artificial."

"A comparação é quase inevitável: seria, então, o ornitorrinco o símile petista do tucano ?"

Ricardo Antunes
"A desertificação neoliberal no Brasil"


 

O companheiro R$ 1.000.000.000.000,00
Elio Gaspari
25/01/2006


Dentro de algumas semanas a dívida pública trará uma novidade amarga para o cotidiano de Pindorama, o mau trilhão. Falta pouco para que chegue lá.Para ter uma idéia da força desse número, há 1 trilhão de segundos (31,5 mil anos) os bípedes ainda estavam na Idade da Pedra Lascada.

Lula deveria organizar um grande evento, o Pró-Juros, um encontro dos sábios que desde 1994 arruínam o país. Para que ninguém acuse o "nosso guia" de fazer campanha eleitoral, ele dividiria o triunfo com FFHH.

Pedro Malan e Antonio Palocci seriam os mestres-salas de um seminário com todos os presidentes e diretores do Banco Central (inclusive, numa linda alegoria, os que estão aninhados na banca privada).
Viria também a bateria do FMI: Stanley Fischer (hoje Citicorp), Teresa Ter-Minassian e Anne Krueger.

Todos propuseram isso e aquilo, sempre invocando a meta suprema da redução da dívida pública. Quando assumiram a gestão da economia nacional, ela equivalia a 28% do PIB. Atualmente passa dos 50%. Pelas contas que apresentaram em 1996, deveria estar abaixo dos 25%.


 

Economia no governo Lula: arrocho e concentração
Odilon Guedes
23/01/2006

Uma questão nova que tem chamado a atenção de vários analistas é o risco de desindustrialização da economia brasileira.O Brasil, que já foi a oitava economia do planeta, hoje ocupa a 16ª posição. Em recente entrevista ao jornal Folha de São Paulo (02/01/06), o economista Gabriel Palma de Cambridge, especialista em desindustrialização, afirma que a indústria brasileira está sendo destruída por uma política monetária “suicida” e que, “no final dos anos 70, um terço do PIB brasileiro vinha da indústria manufatureira. Hoje, não chega a 20%. Isso é um massacre, não tem outro nome, pois é exatamente essa indústria que poderia dar sustentabilidade a um crescimento de longo prazo”.

 

O discurso do atraso nas bocas de Alkmin e Aécio
J. Carlos de Assis
25/01/2005

A expressão mais genuína da degradação do processo político brasileiro pode ser inferida do grito de guerra dos governadores tucanos Geraldo Alkmin e Aécio Neves em sua corrida pela Presidência da República. Segundo eles, aquilo de que realmente o Brasil precisa é de um bom gerente. Nada de alguém capaz de uma concepção estratégica dos caminhos que devemos percorrer, nada de um visionário que nos desperte para um projeto nacional de um maior bem estar social, nada de um espírito realizador que nos reconcilie com o desenvolvimento. Nada disso. Basta um gerente.

Um bom gerente é alguém que põe em prática um plano feito por outro. Se o presidente da República for um bom gerente, como querem Alkmin e Aécio, a pergunta é: a quem caberá fazer o plano? De quem será a proposta política de destino nacional? Quem apontará o caminho dos interesses nacionais a serem promovidos?

Já a “teoria do gerente” corresponde a uma espécie de fusão de fato entre o PSDB e o PT. Subjacente a ela está a idéia de que o neoliberalismo é o fim da história. Não existe nada melhor do que a política econômica em curso.

24 janeiro 2006

 

"Finge que funciona"
José Serra
19/01/2005

José Serra, prefeito de São Paulo, em visita a um posto de saúde, após duas enfermeiras e a própria secretária municipal da Saúde não conseguirem - em sete minutos de tentativa - medir sua pressão arterial, devido a defeito no equipamento.

 

O veneno
Mangabeira Unger
24/01/2006

As grandes empresas e os grandes empresários, a começar pelos bancos e pelas empreiteiras, financiam a política, na maior parte por caixa dois -portanto, criminosamente. Costumam dividir as fichas: apoio para todos os candidatos competitivos; apoio maior para os preferidos. Nas campanhas presidenciais os ricaços se reúnem com os candidatos como se fossem acionistas interrogando os dirigentes das empresas em que investem. No poder, os eleitos achacam os endinheirados. E distribuem em troca proteção do governo para os negócios dos achacados.

As forças que governavam o Brasil antes de Lula burilaram esse sistema. O governo Lula o radicalizou. O presidente ex-operário, que nunca quis saber de confusão, amarelou desde o primeiro dia de seu mandato. Teve medo da luta pela mudança; a falta de idéias deu cobertura para a falta de coragem. A corrupção sistêmica, expressa no regime de trocas de dinheiro privado por proteção oficial, alargou um segundo canal de negocismo, que o governo anterior já havia aberto: o uso dos fundos de pensão para trocar financiamentos eleitorais por investimentos perdedores.

E agora? As 30 mil famílias que recebem o grosso dos juros pagos pelo Estado e que são as beneficiárias de um modelo econômico que mata a produção e arrocha o trabalho estão subornadas por um governo que elas, por sua vez, subornam.


23 janeiro 2006

 


Refúgio no inferno
Mauro Santayana
23/01/2006

Qualquer que seja a reflexão que se faça sobre a violência urbana, uma necessidade se revela, em nosso caso, sobre todas as outras: a de que se reconstrua o Estado nacional. Sua demolição se acelerou há 11 anos, com a capitulação do governo neoliberal a dois e ilegítimos pólos de poder: o estrangeiro, comandado pelos centros financeiros mundiais, mediante o império de Washington, e o dos narcotraficantes, pequenos bandidos e policiais a eles associados, que aterrorizam e dominam a periferia abandonada. O Estado se tornou mínimo, como queriam alguns, cuidando de assegurar o bem-estar dos rentistas e deixando o país sem trabalho, educação, saúde, segurança. Só o medo é oferecido ao povo.

 

Google
João Sayad
23/01/2006

O Brasil, de muito perto, é incompreensível -uma profusão de notícias sobre corrupção. De longe, um problema exótico de macroeconomia. A melhor distância para analisar é a do artista. Distante o suficiente para ser conceitual -quadro, música ou filme. E suficientemente próxima para emocionar, como nos emocionam as coisas que amamos.

19 janeiro 2006

 


Serra em 2006
Paulo Nogueira Batista Jr.


Os donos do poder cultivam certos hábitos e procedimentos, que estão razoavelmente consolidados. A sua preferência é por políticos anódinos, facilmente controláveis, que não tenham opinião formada ou conhecimento próprio sobre questões econômicas. Não basta ser tucano para inspirar confiança.

Comentário que circula no famigerado mercado: "Agora é o Serra quem tem de escrever uma "Carta ao Povo Brasileiro'". Não sei se o leitor lembra desse antecedente desprimoroso. Durante a campanha de 2002, como parte de um amplo esforço para se mostrar confiável e inofensivo, Lula assinou uma "Carta ao Povo Brasileiro". A tal carta recitava uma série de obviedades, mas foi interpretada politicamente como "sinal de maturidade" do candidato e como garantia de que a política macroeconômica não seria alterada. Passou a ser conhecida como "Carta aos Banqueiros".



18 janeiro 2006

 

Reinaldo Gonçalves
"Vagão descarrilhado"

"Alguns economistas de destaque sugeriram que falta ao Brasil, para a retomada do crescimento, a recuperação da auto-estima do povo."


"A percepção que se tem é que, segundo os economistas-psicólogos ( ou psicanalistas ? ), o motor de arranque do crescimento 'vigoroso, virtuoso e sustentável' seria a recuperação da auto-estima do brasileiro, pois as condições objetivas já estariam dadas."

"O que resta como nota de otimismo é esperar que economistas brasileiros - panglossianos, naturalmente - sejam reconhecidos universalmente pela sua contribuição à teoria econômica, mas precisamente à teoria do crescimento endógeno, no qual introduziram uma variável de natureza psicológica."



 


"O desenvolvimento é um estado de espírito. Ele ocorre quando a liderança política é capaz de acender o "espírito animal" dos empresários e levá-los a acreditar no crescimento, o que eleva o investimento e amplia a demanda global."

Delfim Neto
18/01/2006

 

Enfim, chegou a CPI da Privataria
Elio Gaspari
18/01/2005

Se não for abafada, investigará as privatizações ocorridas entre 1990 e 2002. Nesse período, três governos venderam cem empresas da Viúva e arrecadaram US$ 105,5 bilhões. 9 em 10 transações deram-se durante o tucanato. Prometeram abater a dívida pública, mas ela foi de 30% do PIB, em 1995, para 62% em 2002.

Prometiam atrair recursos externos, mas os arrematadores foram socorridos por US$ 15,6 bilhões de empréstimos do BNDES e outro ervanário saído dos fundos de pensão de empresas estatais. Em pelo menos dois setores (elétrico e ferroviário) o velho e bom BNDES teve de correr atrás de caloteiros. Prometiam crescimento econômico e nos oito anos do surto privatista dos tucanos a economia cresceu abaixo de 3%, na mediocridade preservada pelo "nosso guia".

Grampos telefônicos, editais self-service, consórcios incestuosos e contratos de gaveta deram componentes escandalosos ao processo. O apagão de 2001 e as tarifas telefônicas lunares impostas por concessionários retrógrados foram as duas principais seqüelas dessa festa.

O exame da privataria pode ter um alcance superior à simples curiosidade fofoqueira em cima dos grandes patrimônios amealhados no período. (Fofoca: é provável que as privatizações tenham produzido as mais rápidas fortunas da história nacional. Nunca tanta gente ganhou tanto dinheiro em tão pouco tempo, sem produzir um só prego.)


 

A implosão necessária
Mauro Santayna
18/01/2006


O capitalismo moderno (exacerbado com o neoliberalismo) pretendia ser o contraponto do sonho socialista, mas ambos - conforme assinalou, há 35 anos, François Perroux, em uma de suas obras mais importantes (Aliénation et societé industriele) - tinham o mesmo problema, o de não entender que a economia deve ser subordinada à política. É preciso ver, na sociedade, as relações entre os seres humanos e não entre os seres humanos e a mercadoria (e sua equivalência, o dinheiro).

É preciso reinventar tudo, da economia ao Estado, e, para isso, faz falta implodir o castelo de cartões de crédito em que se equilibra a sociedade contemporânea. Enquanto a nova corrupção norte-americana e européia não encontrar as suas CPIs, este ano poderá ser o da grande implosão no Brasil. Implosão dos partidos políticos, anêmicos de idéias e grávidos de estupros infecciosos; implosão do sistema fiscal e tributário concentrador; implosão da centralização política em Brasília, em agressão direta ao pacto federativo; implosão do sistema bancário, cujos lucros, adubados pelas taxas de juros do Banco Central, crescem a cada trimestre como metástases cancerosas no organismo nacional. Toda essa demolição pode iniciar-se com a nova CPI, se os seus membros tiverem consciência de sua responsabilidade histórica.


17 janeiro 2006

 

Octavio Ianni
A Revolução Brasileira

"Essa burguesia, portanto, não avançou nem avança para um projeto político alternativo para a sociedade nacional. Não vai além da própria visão de setor de classe, corporação. Joga com as outras classes sociais, compreendendo as médias, o operariado e o campesinato, de modo tímido, pouco elaborado. Parece recear a mesma aliança que procura. Teme a força política dessas classes, principalmente o risco de ter de compartilhar o poder. Assusta-se com a idéia de reformas sociais, compreendendo a agrária, habitacional, educacional, bancária e outras. Não tem compromissos com a democracia reivindicada nas lutas das classes assalariadas. Não construiu nem constrói um projeto de cunho hegemônico, porque não interpreta os interesses das outras classes e muito menos da sociedade como um todo. Apenas defende os próprios interesses corporativos. Quando se sente ameaçada pelo imperialismo, apela às "massas". E quando é desafiada pelos setores assalariados e camponeses, organizados e ativos, corre aos quartéis e às embaixadas das nações imperialistas."

 


"Parece-me que o candidato natural do PSDB será o Geraldo Alckmin, porque ele cumpre o seu segundo mandato como governador"

Paulo Skaf
Presidente da Fiesp
14/01/2006

16 janeiro 2006

 

Como baixar o nível dos juros
Luiz Carlos Bresser-Pereira
16/01/2006

Solução, porém, existe. A mudança do regime de política monetária implica o envolvimento de todo o governo, a partir do presidente da República. O objetivo será o de baixar a taxa de juros real básica do Banco Central para que essa varie de 1% a 3% reais, separada da taxa de juros de longo prazo dos títulos do Tesouro, que deverá situar-se perto de 5% reais. Para isso, é necessário terminar com a indexação dos títulos federais pela Selic, ou seja, sua indexação pela própria taxa de juros que o Banco Central estabelece sobre as reservas bancárias para realizar sua política de juros.

Portanto, como no caso do Plano Real, para mudar o regime de política monetária, é preciso fazer uma reforma monetária.

Para que esses dois objetivos possam ser alcançados, será necessária uma outra reforma além da reforma monetária: a desindexação dos preços dos serviços públicos, e, mais amplamente, a proibição terminante de o governo brasileiro aceitar qualquer indexação em seus contratos e preços administrados.


 

República Federativa do Brasil
João Sayad
16/01/2006

O projeto mínimo comum para o país é dado pelas condições mínimas de sobrevivência do Brasil: crescer para reduzir urgentemente o número de brasileiros deixados à margem da economia e da sociedade. Ainda que não haja solução para a distribuição de renda, crescer para recuperar a mobilidade social para cima que o país tinha 20 anos atrás.

Não se trata de projeto moral. Trata-se de reduzir literalmente o risco Brasil. É condição para o convívio pacífico entre brasileiros, para que possamos andar nas ruas sem medo, manter a democracia, evitar a eleição de salvadores da pátria e para que os brasileiros continuem vivendo no Brasil.

Como classificar a política de juros do Banco Central? Duas ou quatro pessoas impõem ao país todo, e contra a opinião da maioria dos tecnocratas, uma taxa de juros que diminui o crescimento modesto da economia. Gastam 6% do PIB com juros sem autorização legal ou orçamentária. E valorizam o real em 51%, recorde da América Latina. Não é decisão liberal. Nem democrática.


14 janeiro 2006

 


“Quando você vai olhar a expectativa da taxa Selic para o final do período, ela é de 15% e de 15,94% na média. Ou seja, juros reais colossais, ainda de dois dígitos! Quais são os riscos que levam o mercado a projetar uma taxa real de mais de 10% daqui a um ano? Que diabo de aversão é essa e que risco é compatível com essa taxa?"

Joaquim Levy
Secretário do Tesouro Nacional
13/01/2006

Ministério da Fazenda
Nota à imprensa

Não há desconforto no Ministério da Fazenda em relação à política monetária

Com relação ao texto publicado hoje nas páginas A1 e A2 do jornal "Valor Econômico" sob o título "Juros causam desconforto e mercado prevê corte maior", que apresenta opiniões atribuídas ao secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy, o ministro Antonio Palocci esclarece:

1) Não há desconforto no Ministério da Fazenda com relação à política de juros praticada pelo Banco Central do Brasil. O ministro Palocci tem manifestado publicamente, por diversas ocasiões, seu total apoio à política monetária que vem sendo praticada pelo Banco Central do Brasil, que considera apropriada, inclusive a comunicação pública sobre a mesma. Esta é a posição oficial do Ministério da Fazenda.

2) O secretário Levy esclareceu ao ministro Palocci que não expressou ao citado jornal opiniões sobre política monetária. De qualquer forma, o ministro Palocci desautoriza e desaconselha quaisquer manifestações públicas de membros de sua equipe sobre temas fora da competência funcional dos órgãos que dirigem.

Brasília, 13 de janeiro de 2006.

 


“estamos operando no limite da irresponsabilidade"
Ricardo Sérgio de Oliveira

(Declaração de viva voz captada pelos grampos do BNDES )
Privatização da Telebrás - 29/07/1998

13 janeiro 2006

 



Alternativas à desintegração?
Leonardo Boff

13/01/2005

A autonomização da economia capitalista levada a nivel global tende a realizar a profecia de Marx: destruir as duas fontes de sua riqueza que é a natureza e os seres humanos. Para universalizar seu projeto, ela precisaria de outras três Terras iguais a essa. Como isso é impossível, ela continua a acumular só para si, a criar crescentes desigualdades e a devastar a natureza.

Por todas as partes do mundo há grupos, iniciativas e formas de produção que conscientemente colocam a vida e a Terra no centro das preocupações. Se vier o desastre que prevemos, serão estes que terão a ciência necessária e as experiências acumuladas para continuar o projeto civilizatório humano sobre outras bases mais esperançadoras para a vida e a humanidade. Dai a importância que o número deles cresça.

A vida humana no processo de evolução passou por terríveis crises que quase exterminaram a espécie, especialmente nas grandes glaciações. Mas sempre sobreviveu. Oxalá desta vez não seja diferente.

 

Memórias de uma era de saque
Lauro Veiga Filho
Brasil de Fato - 13/1/2006

Você, contribuinte e consumidor, acreditava mesmo que a privatização de empresas estatais traria todas as vantagens alardeadas pelos governantes de plantão? Realizadas “no limite da ilegalidade”, como chegou a definir um ex-ministro tucano, novamente escolhido como principal conselheiro econômico de um dos pré-candidatos do PSDB à Presidência da República nas eleições deste ano, as vendas das empresas antes controladas pelos governos federal e estaduais deveriam “revolucionar” a economia, trazendo maior “eficiência” e “competitividade”. Já os consumidores e usuários seriam favorecidos consumidores e usuários pela melhora dos serviços públicos em geral.

A “eficiência”, no caso, deveria ter sido assegurada pela cobrança de tarifas e de preços(*) relativamente mais baixos. Conversa fiada, como volta a demonstrar mais um estudo, desta vez realizado pela insuspeita equipe de economistas do ministro da Fazenda, Antônio Palocci.


Concretamente, entre maio de 1995 e novembro de 2005, tomando como base o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que afere o custo de vida para famílias com renda de até 40 salários mínimos, os chamados preços administrados subiram nada menos do que 339%. Ou seja, ficaram, na média, mais de quatro vezes mais caros. No mesmo período, o IPCA, refletindo a inflação oficial, sofreu variação de 126%. Os preços ditos “livres”, já que não dependem da autorização de governos ou órgãos reguladores, subiram bem menos, algo em torno de 93%.

 

Concurso do BC avalia que Lula tomou "medidas conservadoras"
Folha de São Paulo
13/1/2006

A característica marcante do governo Luiz Inácio Lula da Silva é a continuidade da política econômica ortodoxa adotada por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

Pelo menos essa é a opinião que se buscou entre os candidatos que fizeram, no último domingo, a prova do concurso para técnico do Banco Central. Ao todo, são 75 vagas em todo o país, e uma das questões procurava, justamente, colher uma avaliação do candidato sobre o governo Lula.

O teste classificava Lula como sendo "o primeiro presidente brasileiro de esquerda e de origem operária" para, depois, perguntar qual era a "característica marcante" de seu governo.

Eram apresentadas cinco opções de resposta, sendo que a correta, segundo o gabarito, era: "A manutenção da política econômica ortodoxa do seu antecessor, com a adoção de medidas conservadoras como a fixação de altas taxas de juros reais, com o objetivo de conter a inflação".

Entre as respostas incorretas, estavam "a promoção da reforma agrária, bandeira de luta do PT desde a sua fundação, com o assentamento de 300 mil famílias de trabalhadores sem terra por ano desde 2003" e a "adoção de um novo modelo político de governo, em que não se aceita qualquer aliança com partidos de oposição, a não ser que seja para aprovar projetos de interesse da maioria trabalhadora".

O Banco Central informou que o conteúdo da prova é de inteira responsabilidade da Fundação Carlos Chagas. A fundação, por sua vez, não respondeu até a conclusão desta edição.

12 janeiro 2006

 

O conto do vigário do divórcio com o FMI
Informe Econômico - Jornal do Brasil
12/1/2006

Está tudo muito bom, tudo muito bem, mas um atento leitor da coluna pergunta: por que, com todos os diabos, o Brasil pagou antecipadamente sua dívida de US$ 15,5 bilhões com o Fundo Monetário Internacional se este é um dos dinheiros mais baratos do planeta? A questão é ainda mais procedente se considerarmos que, esta semana, o Tesouro Nacional fechou a primeira captação externa do ano, no valor de US$ 1 bilhão - com demanda para mais de US$ 3 bilhões.

O país pagará aos investidores desta emissão juros de 7,55% ao ano. Uma pechincha se considerarmos o atual patamar da taxa básica doméstica, de 18,5% anuais. Mas um disparate se for levada em conta a taxa cobrada pelo FMI em seus empréstimos: 3,17%. É, isto a imprensa não destacou, quando o governo anunciou que estava pondo fim ao conturbado casamento com o Fundo. Por que, então, pagar mais do que o dobro para se financiar e ainda anunciar a decisão como um momento histórico?


 

Cordeiro em pele de cordeiro
Paulo Nogueira Batista Jr.
12/01/2006

Em 2002, as instituições financeiras, especialmente no exterior, ainda temiam Lula. A pergunta delas era a seguinte: O "Lulinha paz e amor" é para valer? Ou seria o proverbial lobo em pele de cordeiro? As dúvidas se dissiparam rapidamente. Hoje, podemos dizer do atual presidente brasileiro o que Winston Churchill dizia do líder trabalhista Clement Attlee: "É um cordeiro em pele de cordeiro".

O que se conhece no Brasil como ortodoxia econômico-financeira seria mais propriamente chamada de heterodoxia selvagem. Afinal, em que outro país do mundo acontece o que se vê por aqui, há décadas e décadas: a remuneração de ativos financeiros, líquidos ou quase líquidos, com taxas de juro extraordinariamente elevadas em termos reais?

Ainda acabaremos dando razão a Thomas Jefferson, que costumava dizer (como me lembrou um outro leitor): "I believe that banking institutions are more dangerous to our liberties than standing armies" (acredito que instituições bancárias sejam mais perigosas para nossas liberdades do que exércitos permanentes).

11 janeiro 2006

 

Contradição Inexplicável: Por quê o Governo Lula acelera endividamento caro e quita antecipadamente dívida bem mais barata?
Maria Lucia Fattorelli Carneiro
10/01/2006

Durante o ano de 2005, o Tesouro Nacional efetuou inúmeros leilões de títulos da “dívida interna”. A taxa Selic, que define os juros incidentes sobre a maior parte destes títulos, apresentou média de 19,13% em 2005. Descontando-se a taxa de inflação medida pelo IPCA, de cerca de 6% em 2005, obtém-se que os juros reais pagos superaram os 13% ao ano! Esta taxa é a maior do mundo, e equivale a mais que o dobro da taxa praticada pelo México (6,1%), o segundo colocado. É preciso ainda ressaltar que, como o Real se valorizou 13,4% frente ao dólar em 2005, os títulos da dívida interna garantiram um rendimento de nada menos que 35% ao ano para os investidores estrangeiros!

Na sequência dessas emissões onerosíssimas para a nação, em dezembro de 2005, o governo Lula ANTECIPOU o pagamento de US$ 15,5 bilhões ao Fundo Monetário Internacional. Comparando-se o cronograma inicial de pagamentos devidos ao FMI com a anunciada economia de US$ 900 milhões, a título de juros, com tal antecipação, verificamos que o custo financeiro da dívida para com o FMI era de cerca de 4% ao ano .

Portanto, na prática, o Brasil ANTECIPOU e ACELEROU o endividamento em títulos da dívida externa ao custo de cerca de 10% ao ano em dólares, aumentou o endividamento “interno” ao custo real de 13% ao ano (sendo que os investidores externos ganharam 35%) e ANTECIPOU o pagamento das dívidas junto ao FMI, cujo custo era de apenas 4% ao ano. Qual é a explicação para movimentos tão contraditórios?

10 janeiro 2006

 



''A decepção é muito mais profunda''
César Benjamin
08/01/2005


"Vi que não tinha mais lugar dentro do PT. Eu ficava falando em projeto, em crise brasileira, quando, na verdade, o jogo era outro, era a composição de interesses"

 

O tema da eleição
Mangabeira Unger
10/01/2006

Para cumprirem essa tarefa, os proponentes da alternativa precisam demonstrar serenidade ardente. O Brasil não quer grito, truque e esperteza. Quer ouvir a verdade, sem rodeios ou floreios: a verdade, ainda que incômoda. Quer sentir que os agentes da alternativa reconheçam os obstáculos a uma reorientação de rumo, que se comprometam a trazer para o governo os melhores quadros técnicos do país, que compreendam a necessidade de trabalhar, honesta e humildemente, com o Congresso Nacional, que tenham a mania de obedecer as leis e que se disponham a investir toda sua energia em algumas poucas prioridades transformadoras.

O eixo da alternativa há de ser a construção de um modelo de desenvolvimento duradouro, baseado na democratização de oportunidades para aprender, trabalhar e produzir.


09 janeiro 2006

 

Quem tem medo de Serra? Ou Lula, a Gilda dos mercados ?
Reinaldo Azevedo
08/01/2005

"O que me parece insuportável é que pessoas que já erraram feio antes, de forma monumental, procurem justificar o desempenho medíocre da economia brasileira segundo o que seria o rigor acadêmico, fingindo-se de ortodoxos. Uma economia entupida de dólares, com superávit primário gigantesco, mas de má qualidade, paga os juros reais mais altos do mundo sob o pretexto de conter a inflação, mas estimula um programa de crédito que se volta para o consumo: a inflação não vai embora de vez, mas o crescimento desaba. Isso é ortodoxia? Isso, sim, é que é heterodoxia; isso, sim, é que é exotismo."

 

  • "Vimos que o governo (Lula) tem agido muito corajosamente na administração da política econômica. Esse governo vem conquistando a confiança da comunidade bancária internacional."

    Rijkman Groenink
    Presidente do banco holandês ABN AMRO
    09/01/2006

 

Por uma crítica do Liberex
Vinícius Torres Freire
09/01/2005

Nos anos de 1970, comunistas discutiam o Sorex: a abreviação de "socialismo realmente existente". Isto é, o império soviético e entorno, algo que deveria ser criticado e revolucionado para que se salvasse o "verdadeiro espírito" de Marx e do socialismo que jamais existiu. Assim como o Sorex, há o Liberex, o liberalismo realmente existente. Os achaques teóricos de liberalóides e comunistas são aparentados -os dos comunistas, mais sangrentos, decerto.

O Liberex tem comitê central, o Copom. Um politburo, a comunidade de economistas banqueiros. Tem sua dialética da natureza: a filosofia da felicidade, do auto-engano e da expectativa racional. Tem um gulag por vezes sem cercas para recalcitrantes, o sopão dos inempregáveis. Para o bem da sociedade, a tortura com juros, científicos, claro.

É preciso derrubar o muro de marfim (falso) da tecnocracia Liberex.

06 janeiro 2006

 

  • "Estamos condenados à civilização. Ou progredimos, ou desaparecemos."

    Euclides da Cunha

 

Raymundo Faoro
"A questão nacional: a modernização"

"A essa conjunção de classes altas, conciliando-se a uma realidade patrimonialista e burocrática, somou-se a domesticação das classes subalternas no clientelismo. Essa coligação do alto, com o enfeudamento popular, excluiu os menos abastados, classe média e operários, do papel de árbitro das divergências dos grandes. Desta sorte, a sociedade civil, já sufocada pelo projeto modernizador, perdia toda função política. E, por essa via, também a função econômica. Esta era, na verdade, o limite da modernidade: mal e apenas permitia a autonomia das classes altas, ao contrário da modernização, que as aprisionava e as dirigia, mas, em comum uma e outra, excluíam do pacto social o povo."

"O povo, por esse meio, não participava da mudança: ele a padecia. Foi o que quis dizer Euclides da Cunha, ao notar que estávamos "condenados à civilização".


 


  • "O PT é uma página virada em minha vida."

José Dirceu
06/01/2005


05 janeiro 2006

 

Francisco de Oliveira
"Adeus às Oligarquias?"

"A fonte maior da formação oligárquica constituiu-se na propriedade da terra, mais que na propriedade dos escravos; daí, talvez, uma das diferenças com o caso norte-americano. A propriedade da terra nunca foi processada por um mercado, enquanto a propriedade dos escravos era mediada pelo infame "mercado negreiro": ou em outras palavras, a terra foi, no caso brasileiro, desde sempre um oligopólio, enquanto os escravos estavam abertos à compra e à venda."

"(...)a associação entre mercado e poder local nos EUA teve o significado que Tocqueville encontrou na 'democracia na América", enquanto a associação entre um não-mercado e o poder local era a "via oligárquica" na colônia brasileira, assim como, em geral, nas colônias espanholas, com algumas especificidades num e noutro caso. Mas, em ambos, o controle da propriedade da terra produziu poderes locais oligárquicos, antiliberais e antidemocráticos."

"Caio Prado Júnior sinalizou mais: a formação de um poder local, que concentrava o poder econômico, social e político nas mesmas mãos, no sentido oposto ao liberalismo que justamente separou economia e política, foi, até certo ponto, uma estratégia do Estado português, ante a impossibilidade de povoar e governar diretamente um imenso território, que engoliria todos os recursos humanos à disposição da Coroa, que, aliás, ainda não havia alcançado sequer o estágio do absolutismo, com a completa ausência de uma burocracia estatal."

 

As chances de Lula em 2006
Paulo Nogueira Batista Jr.
05/01/2005

Uma coisa ficou clara ao longo do ano passado: uma parte da elite brasileira, possivelmente a maior parte, está mobilizada contra a sua reeleição -e essa é uma das principais barreiras que Lula terá de enfrentar em 2006. No Brasil, as elites formam um clube bastante fechado, que controla os principais meios de comunicação, boa parte do Congresso e do próprio governo federal. Exerce influência avassaladora sobre a área econômica, especialmente sobre o Banco Central.

Os integrantes do clube, por sua vez, descobriram, encantados, que é perfeitamente possível "sangrar" o governo e o presidente da República sem desestabilizar a economia e sem perturbar o andamento da política econômica que tanto lhes favorece.

Nesse ambiente, Lula só tem um caminho: acelerar o crescimento da economia. A ampliação do ritmo de crescimento da produção, com aumento mais rápido dos níveis de emprego e renda, é a única forma que ele tem de conquistar o povo e neutralizar o enorme desgaste resultante dos escândalos de corrupção e sua intensa divulgação na mídia nacional. Em outras palavras, restaria ao lulismo tentar reeditar, de alguma maneira, o velho mote adhemarista: "Rouba, mas faz".

 


Desintegração criativa?
Leonardo Boff
05/01/2005

Ao considerar o estado da Terra e a cena política mundial, também brasileira, me encho de temores. Podemos ir ao encontro de uma grande desintegração. Esta reside no fato apontado por vários analistas a começar por Marx, pelo economista norte-americano de ascendência húngara Karl Polanyi e entre nós pelo brasileiro Michael Löwy: a economia se desgarrou da sociedade. Desinserida e desvinculada de qualquer controle social, estatal e humano ela ganhou livre curso. Funciona obedecendo a sua própria lógica que é maximizar os ganhos, minimalizar os investimentos e encurtar ao máximo os prazos. E isso em escala mundial e sem qualquer cuidado ecológico. Tudo vira um grande Big Mac, tudo é colocado na banca do mercado: saúde, cultura, órgãos, religião.


O efeito mais desastroso desta transformação consiste em reduzir o ser humano a um mero produtor e a um simples consumidor. O resto são zeros econômicos desprezíveis: pessoas, classes, regiões e inteiras nações. O trabalho morto (máquinas, aparelhos, robôs) suplanta o trabalho vivo (os trabalhadores). Tudo é reduzido a mercados a serem conquistados para poder acumular de forma ilimitada. O motor que preside esta lógica é a competição a mais feroz possível. Só o forte subsiste, o fraco não resiste, desiste e inexiste.

04 janeiro 2006

 


Maria da Conceição Tavares
"Política e economia na formação do Brasil contemporâneo"

"A chegada tardia do capitalismo brasileiro à primeira revolução industrial deu-se nas entranhas do complexo cafeeiro a partir do "encilhamento" do último quartel do século XIX. Já a implantação, igualmente tardia, da indústria pesada da segunda revolução industrial só foi iniciada a partir da década de 50 e terminou com o governo Geisel, 30 anos depois. Nesta longa trajetória de mais de cem anos de história da indústria e de desenvolvimento de forças produtivas especificamente capitalistas, não foi possível conduzir o país nem à condição de potência intermédia na Ordem Mundial, nem à geração de um núcleo endógeno de ciência e tecnologia capaz de imprimir ao Brasil o seu "destino manifesto" da modernidade desejada por meio do progresso. Este, apesar de colossal, não nos retirou da nossa condição de país subdesenvolvido, nem da combinação "excêntrica" de Estado nacional periférico e de economia capitalista fortemente dependente do capital internacional. O tipo de dependência comercial, financeira e sobretudo cultural é que tem mudado."




 

A curva fora do ponto
J. Carlos de Assis

Tenho sustentado há anos que, na institucionalidade fiscal-monetária brasileira, não é possível prever com razoável exatidão o comportamento do PIB a curto e médio prazos. Há longo prazo, sim, é possível prever: fica em torno de um crescimento anual médio de 2%, um pouco acima do crescimento da população. Dessa maneira, ninguém espere que a economia vá mergulhar de vez numa depressão. A mesma institucionalidade que impede crescimento a altas taxas, impede também quedas exageradas.

De fato, no Brasil, pobre ganha à vista e gasta a prazo, pagando juros exorbitantes; enquanto rico ganha juros de forma permanente no over, e gasta à vista. O efeito riqueza, entre nós, não é, pois, resultado de poupança; é acumulação de receita financeira sobre saldos diários de caixa dos endinheirados, no over. Esta distorção não está identificada em nenhum livro texto de economia. É a contribuição singular do Brasil, e especificamente de seu Banco Central, na construção do mais perverso mecanismo jamais conhecido de transferência de renda e de riqueza de pobre para rico na história do capitalismo.

Nossa institucionalidade fiscal-monetária não tem similar no mundo. É a reconstituição do sistema oligárquico colonial, sob controle do estamento bancário e financeiro. Este sistema trata como idênticos moeda corrente e poupança, atribuindo juros a moeda corrente e atribuindo liquidez à vista à poupança. A taxa do over, que em qualquer economia organizada é um instrumento de regulação de reservas bancárias, no curtíssimo prazo, aqui remunera quase a totalidade dos títulos públicos, independentemente de prazos de maturação.

03 janeiro 2006

 

Wladimir Pomar

"A burguesia brasileira não surge, pois, das entranhas de uma sociedade feudal que não exisitu no Brasil. Ela não nasce, também, como a burguesia européia, das camadas médias que se aglomeram nas cidades medievais em função do comércio em expansão, camadas que se viram obrigadas a lutar contra a nobreza feudal para livrar-se das travas que impediam seu desenvolvimento. E, muito menos, como a burguesia americana, de pequeno-burgueses independentes."

"Ao contrário. A burguesia brasileira nasce do entesouramento praticado pelos latifundiários e grandes comerciantes e sob a proteção do Estado. Nasce, pois, no berço esplêndido das velhas classes dominantes."

"Não nasce, desse modo, contra elas. Nasce caudatária e agregada a elas e a seus interesses."

"Nascida caudatária e dependente das antigas classes latifundiárias e da burguesia estrangeira, os interesses da burguesia brasileira e dessas classes entrelaçam-se e completam-se no correr da história."

 

Dois votos de Ano Novo
Mangabeira Unger
03/01/2006

"Que, dentro de uma de nossas selvas, onde a imagem da grandeza se contrapõe a nossa mesquinharia, mão invisível e irresistível desfira, de um arco feito de nossas falhas evidentes e de nossas aspirações secretas, uma flecha; que ela voe silenciosa na noite de nossa desesperança, carregada pelos ventos do amor e da imaginação; que, no meio da escuridão, ela se parta em 180 milhões de flechas e que todas caiam no país, ferindo, ao caírem, um dos olhos de cada brasileiro; que a ferida, em vez de cegar, desvende, fazendo-nos não apenas ver o Brasil que há mas também vislumbrar o Brasil que pode haver; que essa visão inesperada e perturbadora acenda em cada de um nós ardor sem fim e que desse ardor nasça para o povo brasileiro, no Ano Novo, nova vida."

02 janeiro 2006

 

"O PT foi um sonho que desmoronou"

Francisco Whitaker
02/01/2006

"O PT vai sangrar muito para poder se colocar diante da sociedade outra vez com uma credibilidade que ele conquistou ao longo de 20 anos."
"Eu me considero traído(...). Porque eu dediquei parte da minha vida para construir esse partido.(...) para mim, sabe, soou como se fosse uma facada nas costas de alguém que junto com outros milhões de brasileiros dedicou parte da sua vida para construir um instrumento político que pudesse ser diferente de tudo que estava aí.


Lula
01/01/2006

 

Mais fortes e mais seguros
Palocci - 31/12/2005

"Em 2005 , o país cresceu em muitos aspectos e se tornou mais forte e seguro de si."

Uma herança medíocre
Carlos Lessa

31/12/2005

O triênio Lula repetirá a débil média de crescimento dos últimos 15 anos. Nossos 2,5% só superam, no Novo Mundo, o crescimento de El Salvador, Haiti, Jamaica e Guiana.

Os emergentes crescerão, neste ano, 6,4%; o mundo, 4,3%. O Brasil não emerge, rasteja. Enquanto isso, o governo federal paga R$ 146 bilhões de juros da dívida pública, a qual não pára de crescer e já se aproxima de R$ 1 trilhão. Segundo estimativa do professor Marcio Pochmann, 70% desses juros destinam-se a apenas 20 mil famílias.

As agências de "rating" advertem: se o país não cresce, não reduz a dívida interna.Mas o governo não escuta o óbvio: o capital estrangeiro investe nas economias que crescem. Continuará, pois, indo para a China.

 

Juros altos e câmbio destroem indústria
Gabriel Palma
02/01/2006

Não é que o Brasil tenha se esquecido do crescimento, mas pensa que ele nasce de forma relativamente espontânea quando se tem equilíbrio fiscal, monetário e na balança de pagamentos. Nenhum país do mundo cresceu dessa forma.


No final dos anos 70, um terço do PIB brasileiro vinha da indústria manufatureira. Hoje, não chega aos 20%. Isso é um massacre, não tem outro nome, pois é exatamente essa indústria que poderia dar sustentabilidade a um crescimento de longo prazo.


Conheço muita gente da atual equipe, inclusive o Murilo Portugal (secretário-executivo do Ministério da Fazenda), que foi meu aluno em Cambridge. Todos têm uma aversão enorme a riscos e um abandono absoluto de tudo o que tenha a ver com políticas de crescimento.

 

Transferência indevida e injusta
Luiz Carlos Bresser-Pereira
02/01/2006

Agora, os mesmos analistas que viam nos 4,9% de 2004 a demonstração da boa política econômica atribuem os parcos resultados de 2005 a essa mesma política.

Os juros básicos do Banco Central têm sido, nos últimos anos, entre quatro e seis vezes maiores do que o risco-país justifica. Isso é sinal de desequilíbrio macroeconômico grave. O preço que pagamos por não atacarmos esse mal através de uma estratégia que atribua alta prioridade à baixa dos juros é a concentração de renda nos muito ricos; é a quase-estagnação; é crescermos menos do que a metade do que crescem os demais países, e muito menos do que a metade do que crescem os países que têm verdadeiras estratégias nacionais de desenvolvimento.

 

Bevilaqua foi para a luz do sol
Elio Gaspari
01/01/2006

Aconteceu uma coisa boa, o diretor de política econômica do Banco Central, doutor Afonso Bevilaqua, saiu da clandestinidade e apareceu na vitrine de Brasília explicando a ruína que coordena.

Ele é, de longe, a personalidade mais forte da mesa do Copom. Discreto, nem biografia na página da instituição tem.

O professor Bevilaqua doutorou-se na Universidade da Califórnia, em Berkeley, e chegou ao BC depois de uma profícua carreira no Departamento de Economia da PUC do Rio de Janeiro. Desde a fundação da Sorbonne em 1253, nenhuma equipe de professores de instituição de ensino superior produziu tantos banqueiros bem-sucedidos como a PUC carioca.

Em outubro de 2002, quando Lula pedia votos atacando a política de juros do BC, Bevilaqua disse que o companheiro dava "sua contribuição ao festival de disparates econômicos". Em maio de 2003, "nosso guia" colocou-o na diretoria do Banco Central, unificando a produção de disparates.

This page is powered by Blogger. Isn't yours?